sábado, 28 de novembro de 2015

'Se Brasil formasse médicos como professores, pacientes morreriam', diz Mercadante

FOLHA DE SÃO PAULO
ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
EDITORA DE "MERCADO"
28/11/2015 02h00

Mais profissionalização é a resposta do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, à análise de economistas de que falta qualidade ao ensino brasileiro e, sem isso, a economia do país não crescerá de forma sustentada.

A formação dos professores tem que se voltar para a prática, diz: "Se formássemos nossos médicos como formamos nossos professores, os pacientes morreriam".

O ministro critica o desempenho das universidades que preparam os docentes —"principalmente no setor privado"— e diz que o MEC vai exigir contrapartidas para repassar as verbas dos programas federais.

Mercadante afirma que há simpatia à ideia de incluir o ensino profissionalizante no currículo do ensino médio e propõe vincular o Pronatec, de formação técnica, ao EJA, antigo supletivo.

Defende a política de dar prêmios em dinheiro a escolas e professores que atingirem metas e acha que entregar a administração escolar a Organizações Sociais (entidades privadas sem fins lucrativos) pode dar bom resultado.

Não apoia, no entanto, a política de "charter schools", em que escolas privadas recebem do Estado para prestar o serviço da educação gratuita.

Folha - Vários economistas têm dito que o Brasil não vai crescer de forma sustentada sem aumento de produtividade, e a qualidade da educação está na raiz desse aumento. Por que o ensino não melhora?

O Brasil tem que acelerar sua transição para uma economia do conhecimento. Educação, ciência e tecnologia e inovação são a base dessa estratégia.

A educação, principalmente, se estiver melhor articulada com o setor produtivo.

O empresariado brasileiro tem uma certa dificuldade em ter cultura inovadora, o que tem muito a ver com sermos um capitalismo tardio, em que o empresário acha que inovar é comprar máquina pronta e acabada e não fazer melhor, mais barato, mais eficiente que o que fazia antes. Este caminho é o que nos vai permitir avançar. Conseguimos isso na agricultura.

É uma área em que o Brasil tem vantagens competitivas.

Mas não é só porque temos terra e água. Temos a Embrapa, temos tecnologia, uma indústria de máquinas e equipamentos.

E capital também.

Mas é isso que gera o capital. Inovação, competitividade e eficiência vão atrair o capital e modernizar o setor.

O caminho tem que ser como o do brigadeiro Montenegro [Casimiro Montenegro Filho], que criou o ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica], para formar uma geração de engenheiros, para que pudéssemos ter uma indústria aeronáutica.

O foco era a indústria, mas o alicerce era educação.

Ele quis chegar, e chegou, à indústria aeronáutica e astronáutica, mas pela educação.

Esse deveria ser o caminho do Brasil. Precisamos mais dessa parceria com universidades.

Por que o Brasil não está conseguindo melhorar a qualidade do ensino?

Está avançando. Educação é muito complexa: uma rede de 50 milhões de alunos, 2 milhões de professores, com o histórico que herdamos, é um processo.

Avançamos muito no acesso às creches, na educação infantil, no ensino fundamental. A jornada escolar está aumentando. Passamos de 4,7 anos para 8 anos em menos de 15 anos. Na universidade, nem falar. Eram 2,5 milhões nos anos 2000, agora são 7,5 milhões e meio.

Mas o problema não é o acesso.
Acesso e permanência.

O sr. não citou o ensino médio, em que o acesso, a permanência e a defasagem não são boas.

Em 1991, havia 2,4 milhões de estudantes no ensino médio. Hoje são 7 milhões.

Mas só 70% estão no ensino médio, grande parte fora da idade correta.

Mas houve uma inclusão de quase 5 milhões de jovens, num período muito curto. O problema é o que herdamos.

Mais do que dobramos a rede, e foi a rede pública que suportou esse crescimento, pois a privada praticamente não se alterou.

Houve grande avanço em termos de acesso e permanência em todos os níveis, inclusive no ensino médio, que acho que merece uma reflexão maior, porque é mais complexo.

O Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, que leva em conta aprovação escolar (chamada de fluxo) e médias de desempenho nas avaliações], ao incluir o fluxo, sinaliza a importância de não deixar nenhuma criança para trás.

E houve avanço também na aprendizagem, que é a coisa mais importante, o foco da educação. A meta mais importante é a da qualidade, em todos os níveis.

No caso do Pisa [Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, que avalia estudantes na faixa dos 15 anos], a fotografia ainda é ruim, mas o filme é muito bom.

O fato de que o Brasil foi o que mais evoluiu no mundo, passou países da América Latina dos quais sempre estivemos atrás, tendo feito uma inclusão dessa magnitude, mostra que houve um avanço importante, mesmo em relação à qualidade.

Quando pegamos nossa amostra, de 950 escolas e jovens de 15 anos, a média é problemática. Onde está a dificuldade real? Não é na média. São os pobres. Onde não avança, onde o Ideb não avançou no ritmo que se esperava é no último quartil da renda, nos 25% mais pobres, que vêm de uma família não letrada, que já na infância tem um vocabulário em média de um terço do das famílias letradas.

É essa criança, a criança da periferia das grandes cidades e das pequenas cidades do interior, a criança que não está indo para a pré-escola. Elas não desenvolvem as habilidades cognitivas e não cognitivas na idade adequada.

Já identificamos a dificuldade da leitura, do aprendizado da escrita e dos elementos básicos da matemática —22% das crianças não leem na idade adequada, 34% não escrevem e metade não aprende a matemática até os oito anos.

E, se a criança não aprendeu a ler, não vai ler para aprender. Quando passa para a sexta série, se desorganiza. É o primeiro momento da evasão.

E no ensino médio, com 18, 19 disciplinas, não consegue mais acompanhar.
O foco tem que ser na leitura, na redação e na matemática.

Damos bolsa para 300 mil professores e professoras, 600 mil formadores das redes de universidades federais. Em algumas, avançou muito. Noutras não avançou nada.

Em muitos cursos de pedagogia e licenciatura estamos tendo uma formação teórica interessante, uma reflexão sobre a filosofia da educação, a teoria da educação, mas muito pouco de prática de aprendizagem na sala de aula.

O Estado de São Paulo está mudando isso agora. Existe uma disposição do governo federal para mudar também?

Estamos trabalhando fortemente para isso.

Se nós formássemos os nossos médicos como formamos nossos professores, íamos ter uma crise na saúde dramática. Porque, se um médico chegar à frente de um paciente e começar a refletir sobre a teoria da saúde, sobre ética e saúde, filosofia da saúde, o paciente morre. Ele tem que fazer o diagnóstico e dar a terapia.

Se o engenheiro não botar o prédio na planta e fizer o cálculo, se começar a refletir sobre as várias opções da teoria da construção civil, o prédio vai cair.

Não que a gente tenha que abdicar de uma reflexão teórica abrangente na educação, mas tem que ter a prática, como aprender, como transmitir conhecimento, como liderar uma sala de aula, como observar os alunos, acompanhá-los.

Qual o obstáculo para mudar o currículo?

A grande mudança de que precisamos é fazer a base nacional comum curricular. Ela vai exigir, como em outros países, uma rediscussão dos cursos de pedagogia e licenciatura. Vai definir o que é o direito de aprendizado de qualquer aluno em qualquer lugar do território nacional. Isso reorienta os cursos de pedagogia. Temos que repactuar. O grosso dessa formação está se dando na rede privada.

Temos alguns instrumentos para ajudar na construção. Um é o Pibid [Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência, que dá bolsas para estágios na formação de professores], com 90 mil bolsistas, e o Pafor [Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica], que já é para a rede.

Damos 90 mil bolsas e só 18% viram professores da rede. O projeto é da faculdade e não da rede. Temos que ter exigências da rede.

Vai direcionar para matemática e português?

E para aprendizagem. O MEC vai monitorar esses estágios e estabelecer condições. O foco é a aprendizagem do aluno. Com isso, vão ser formados dentro de uma nova concepção, em vez de só fazer um trabalho para a faculdade sem qualquer compromisso para a escola.
Hoje, quem escolhe a escola é o aluno ou a faculdade, e não o MEC nem a rede.

Como fazer na prática?

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Como fizemos com o Fies [Fundo de Financiamento Estudantil, que financia estudantes do ensino superior]. A inscrição será no portal do MEC, que vai estabelecer quais as escolas prioritárias, vai rediscutir o programa com as faculdades, focado nas prioridades educacionais.

O que o Fies está fazendo é induzir o sistema à qualidade: "Ora, melhora a qualidade e você tem mais bolsas". Evidente que tirou o sistema da zona de conforto.

Então houve falta de objetivos ao expandir tanto o sistema sem esses critérios?

Não, acho que, na política pública, você vai aprimorando e construindo em cima de uma experiência concreta. Vai identificando os problemas em cima do que vai construindo.

Por que foi preciso fazer uma revisão do seguro-desemprego, que está aí há anos? Da aposentadoria? Da pensão por morte? Porque são programas sociais que precisavam de ajustes.

Na educação é a mesma coisa. Por exemplo, no Plano Nacional para a Alfabetização na Idade Certa, percebemos que não adianta fazer uma relação direta com as universidades, em algumas funcionou muito bem, mas em outras não está havendo aumento do aprendizado na sala de aula.

Precisamos melhorar no Nordeste, e é possível. Há boas experiências, no Ceará e na Bahia, vamos fazer um programa especial para o Nordeste.

No Ceará houve um investimento muito forte na gestão, na profissionalização dos diretores, na autonomia para contratar e demitir professores. Existe alguma disposição do MEC de incentivar também esse movimento?

Concordo inteiramente. O mais importante na aprendizagem é a relação professor-aluno, e a segunda coisa é o papel do diretor.

O diretor é imprescindível, precisa ter noções de administração, orçamento, gestão, pedagogia, habilidade e formação para administrar conflitos não violentos, criar uma cultura de tolerância. É quem tem que preencher quando os professores faltam, e estão faltando demais em muitas redes.

O MEC vai ter um programa de formação e criar uma certificação de diretores. Os diretores serão escolhidos já com essa certificação: quem quiser ser diretor terá que se qualificar previamente. Para ser certificado, precisará passar por uma avaliação e elaborar um projeto pedagógico para sua escola. Isso pode dar um salto importante.

Mas voltando um pouco à questão da qualidade, não é só o quartil mais pobre que tem desempenho pior, mas em todos os quartis o aprendizado do aluno brasileiro é mais baixo que o de países semelhantes. Não é um sinal de dificuldade para melhorar a educação? Onde está travando a melhoria do ensino?

O próprio Pisa, em seu relatório, aponta o Brasil como um país que foi capaz de aumentar a inclusão de alunos e a aprendizagem. Muitos desses alunos vieram de regiões rurais, mais pobres. Nós evoluímos trazendo a pobreza para a escola, a população de famílias de pouca escolaridade. E apesar disso a nota de matemática melhorou em todos os níveis.

Não vejo problema em comparar o Brasil com países da OCDE. Mas temos uma renda per capita de US$ 15.838, dados de 2014, e a média da OCDE é US$ 38.766. Eles investem muito mais por aluno. Nosso investimento em porcentagem do PIB é maior que o deles. A ONU recomenda de 3% a 4% do PIB, estamos investindo 6%, mas nosso PIB per capita é muito menor, nosso orçamento por estudante é muito menor.

Mas países semelhantes ao Brasil, como México, Chile, têm obtido melhor resultado.

O Brasil fez uma política de inclusão fantástica, sem precedentes, e, apesar disso, está melhorando a qualidade.

Onde está melhorando menos é nessa população que entrou na escola tardiamente e traz essa herança. Esse jovem de 15 anos é dessa escola do passado.

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Precisa andar mais rápido? Precisa. Por isso estamos repensando, buscando integrar os programas com foco no aprendizado.
E mudando a política de formação e valorização dos profissionais. O Piauí, por exemplo, está dando um 14º salário se houver mais de 25 alunos por sala, o resultado do Ideb superar a meta e assiduidade dos professores ficar dentro do estabelecido.

No Ceará, o município tem aumento do ICMS se tem bom resultado. Precisamos ter mais criatividade, mais inovação, mais motivação dos profissionais na sala de aula.

A motivação passa então por um reconhecimento em dinheiro?

No caso dessas redes, o que estou vendo é que esse mecanismo de valorização, de bonificação pelos resultados, está tendo sucesso. Vamos olhar essas experiências sem preconceito.

Em São Paulo houve essa experiência e a conclusão foi de que não dava o resultado esperado.

Estou jogando luz sobre experiências que estão dando certo já há vários anos. O que me preocupa são algumas propostas como o programa do PMDB, que ainda vai ser discutido -espero que de forma aprofundada-, de retirar as vinculações de tributação.

Se retirar a obrigação do prefeito de investir em educação, do governo do Estado, da União, se retirar a obrigação de que o dinheiro do petróleo e do fundo social venham para a educação, como vamos garantir os recursos que estão faltando?

Porque, apesar da vinculação, nosso investimento per capita é baixo quando comparado com os países mais desenvolvidos. Se retirar a vinculação, vai tirar dinheiro da educação.

Se é verdade que educação não se resolve com dinheiro, não se resolve sem dinheiro nem com menos recursos.

Temos um problema de financiamento da educação, principalmente em relação às metas do PNE [Plano Nacional da Educação], que são muito ambiciosas e propõem que a gente chegue a 10% do PIB. Só não discute como. E o PNE não pode virar o tratado de Kyoto, com o que todo mundo concorda, mas depois ninguém consegue cumprir. Temos que discutir o financiamento da educação, formas de financiamento novas, que viabilizem, porque é um investimento estratégico.

Mas o investimento em educação no Brasil vem crescendo em proporção do PIB ano a ano, sem uma melhoria correspondente. O Ipea divulgou recentementeum estudo mostrando que o gasto em educação no Brasil é pouco eficiente. Por que o dinheiro não está dando o resultado esperado?

Mas pusemos 5 milhões de jovens no ensino médio, 5 milhões de estudantes universitários a mais. Estamos comparando com países cuja população total é menor do que o que colocamos a mais.

Não é um problema então de má administração dos recursos?

Não. Houve um esforço brutal de inclusão social. Resolvemos alguns problemas, como em relação ao analfabetismo. Em 2004 era 11,5% e estamos com 8,3%. Até os 20 anos, 0,9%, erradicamos o analfabetismo. Até 30 anos, são 2,1%.

*Mas o analfabetismo funcional ainda é alto

Mas tivemos que trazer milhões de jovens, 5 milhões a mais no ensino médio, 5 milhões na universidade.

NoPronatec, fizemos um programa com 9 milhões de matrículas no ensino técnico profissional. "Ah, mas e a qualidade?" Aí vocês não dão destaque, mas deveriam ter falado do World Skills, olimpíada mundial do ensino técnico, em que o Brasil foi primeiro lugar em 69 países.

Fui à assembleia da Unesco e todos os ministros da educação dos países ricos queriam discutir Pronatec. E a pergunta é a seguinte: como um emergente tirou primeiro lugar no World Skills? O que vocês fizeram?

Há um esforço forte de formação da rede Sest/Senai, não?

Mas, das 35 medalhas de ouro que tiramos, 28 tinham bolsa do Pronatec. Foi a parceria que fizemos. A rede Sest/Senai faz um trabalho excepcional, e nós trabalhamos em íntima parceria. Massificou o acesso.

Por que o Brasil é bom em futebol? Porque em cada esquina tinha um campinho de futebol. Por que nós somos bons de vôlei de praia? Porque temos muita praia, o pessoal começou a jogar vôlei. Onde o brasileiro tem chance e oportunidade, temos bons desempenhos. Na hora em que se massificou o ensino técnico profissional surgiram os talentos e nós ganhamos a olimpíada.

Mas o World Skills não reflete todo o ensino. Os participantes fazem um treinamento intensivo, de meses, para participar.

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Ah, só nós, né? A Coreia não faz? Você acha? Todos esses países fazem treinamento especial.

Nós investimos R$ 1,6 bi nos centros de formação técnica do Senai para criarmos uma cultura de inovação. Precisamos dessa parceria. Temos um sistema excelente de formação técnica, mas sem escala. Precisa ter escala. Neste ano, com restrições orçamentárias, o Sistema S vai colocar mais recursos, R$ 5 bilhões, cada um na sua área. Vão assumir com mais protagonismo o Pronatec, a Embrapii e outros programas de parceria.

Em troca de não perder uma parcela do imposto que era repassado pelas indústrias.

Exatamente. Muito melhor construir uma parceira, um acordo.

Por que o ensino profissionalizante não está incluindo na base comum curricular?

Grande questão. Sobre o ensino médio, um dos grandes problemas é que, apesar de entrarem 5 milhões de alunos, temos evasão e uma escola que tem que ser mais motivadora e agradável. 20% dos jovens de 18 a 24 anos estão na universidade. Onde estão os outros? O que oferecemos a eles? Só um ensino regular? Não é suficiente.

Na base nacional comum do ensino médico, temos que trazer uma base técnica profissional. Porque esse jovem está olhando o mercado, e muitos estão saindo para buscar uma oportunidade.

É preciso criar um diálogo com o ensino técnico profissional já no ensino médio, sem prejudicar nem desmotivá-los a ir para a universidade, se quiserem, ou para uma escola técnica de dois anos pós-médio.

Mas ter um ensino técnico concomitante com o regular.

As escolas com melhor desempenho no Enem e no Ideb são as que integram as duas coisas.

E por que o ensino técnico não foi incluído na base comum curricular?

Outro ponto é o do EJA [Educação de Jovens e Adultos, o antigo supletivo]. O Fundeb investe R% 5,7 bilhões por ano. Dos matriculados, só 9,4% concluem e são certificados. Os diretores de rede têm interesse na matrícula porque ela assegura participação no Fundeb. Mas é evidente que ele tem que ser repensado.

Vai se criar algum tipo de condição?

Só vejo um caminho: a relação com o Pronatec. Trazer o ensino técnico profissional para essa população adulta que tem uma grande defasagem idade-série.

Tenho um secretário-executivo cujo pai é pedreiro. Tem mais de 60 anos. Ele perguntou "Pai, por que o senhor não conclui o ensino médio?" O pai respondeu "Eu trabalho oito horas por dia, carrego saco de cimento, tijolo, sustentei vocês todos com meu trabalho de pedreiro. Vou estudar geografia, história, filosofia, sociologia, à noite, cansado o que isso vai mudar na minha vida a essa altura do campeonato". É uma pergunta básica. Aí meu secretário perguntou "Mas o senhor consegue ler a planta do engenheiro?" "Não, quem faz isso é o mestre de obras". "E se tivesse uma formação para ler a planta e pudesse ser mestre de obras?" "Onde é esse curso, que eu quero entrar."

É evidente que uma formação do EJA que parte da formação que o profissional já tem, se isso é reconhecido, certificado, e dou uma formação para dar um passo na profissão, esse profissional vai estudar com paixão. Foi o que o Pronatec mostrou.

Por que 9 milhões foram para o Pronatec e no EJA só 4,9% concluem? Porque querem uma formação voltada para o mercado de trabalho.

Mas a grande maioria do Pronatec, 70% desses 9 milhões, fez cursos de curta duração.

Porque são duas coisas distintas, uma parte é formação técnica e outra é tecnológica.

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Para a mãe do Bolsa Família, a porta para saída do programa é o Pronatec, para tentar entrar no mercado de trabalho, montar uma microempresa.

A mesma coisa em relação ao trabalhador desempregado. Se ele faz um curso de requalificação profissional, tem mais chance de se reinserir no mercado de trabalho num melhor padrão.

Temos que aproveitar a crise, é um momento tão importante que a gente não pode desperdiçar. A crise no mercado de trabalho vai exigir mais formação. Temos que aproveitar o desemprego e oferecer: "Venha estudar, que o Brasil vai ganhar mais eficiência e mais produtividade".

Por outro lado, um estudo do Ministério da Fazenda com 160 mil desempregados, que acaba de ser publicado, concluiu que os cursos de curta duração do Pronatec não aumentam a empregabilidade nem a renda.

Não concordo com aquele estudo, que é do terceiro escalão do Ministério da Fazenda.

O MEC tem algum estudo semelhante?

Tem, o Senai tem e o Banco Mundial também teve mostrando que não é este o caminho. Em 2014, com uma taxa de desemprego de 4,7%, falar que não teve empregabilidade alta com amostra absolutamente pequena em relação ao programa Não acho um dado relevante.

Como o MEC acompanha a empregabilidade dos alunos do Pronatec.

A empregabilidade quem tem que acompanhar é o Ministério do Trabalho.

Mas o objetivo do programa é a empregabilidade, certo?

Sempre. Ou fazer com que quem está empregado cresça profissionalmente.

Mas, quando se implanta um programa, é preciso fazer ajustes. Fizemos uma pesquisa para olhar em cada microrregião qual o perfil, qual o emprego portador de futuro daquela região, para oferecer uma formação técnico-profissional ligada à perspectiva do mercado de trabalho.

É preciso uma análise da estrutura produtiva e da perspectiva futura do mercado de trabalho. Não é simples fazer isso.

O sistema S tem que lutar para que o aluno conclua o curso e não simplesmente se acomodar porque recebe um repasse de recurso.

Tudo isso tem que ser aprimorado. Agora, o resultado é fantástico. Quem não quer ver é só olhar para o World Skills.

Um dos problemas...

...Eu não gosto dessa discussão. O ajuste fiscal tem que ser feito, nós temos uma situação fiscal difícil. Mas não dá para fazer uma análise simplificatória de políticas sociais para justificar ajuste fiscal, isso não é um ajuste de boa qualidade.

O que o senhor está chamando de análise simplificatória é esse estudo da Fazenda?

Não... estou falando só preventivamente.

No caso do Fies, acha que houve também análise simplificatória?

Não, acho que houve uma mudança indispensável. Participei desse processo que te descrevi.

Uma das causas desse descasamento entre quantidade e qualidade não é a falta de parâmetros de avaliação da política pública em educação?

Mas há uma avaliação.


Não estou me referindo ao ensino básico, mas a esses programas voltados para a produtividade.

O Brasil é uma referência. Os países desenvolvidos todos estão discutindo o Pronatec e o World Skills. Os países pobres, a África portuguesa, onde ajudamos a implantar a rede de ensino, o olhar deles é para o nosso sistema de avaliação. Porque a maioria dos países não tem um sistema de avaliação da universidade privada.

Nós temos o CPC [indicador de qualidade de cursos superiores] e vamos introduzir o fluxo agora. Uma universidade que forma mais alunos em porcentagem terá um bônus. Os cursos que tiram notas ruins perdem não só o Prouni e o Fies, mas perdem o vestibular.

Há que ter rigor na avaliação. O Ideb, a ANA, são sistemas de avaliação.

Mas estou perguntando sobre os programas específicos voltados a aumento de produtividade e inovação. O quanto se acompanham as pessoas que receberam o investimento? O investimento em ensino superior, que é alto no Brasil, beneficia o aluno, individualmente. Como o MEC acompanha o retorno desse investimento em termos de desenvolvimento do país? Aumentou o número de patentes de quem ganhou o Ciência sem Fronteiras? Eles voltaram para o país? Como avaliar se esse dinheiro está sendo bem empregado?

Temos que aprimorar os programas. O Ciência sem Fronteiras não é diferente, e estamos discutindo.

Mas precisamos internacionalizar. Um estudante desses que volta motivado, aprende línguas, tem um universo aberto, isso terá um impacto nessas instituições. Nos rankings internacionais, um dos problemas da universidade brasileira é a falta de internacionalização. Em muitos países, fizemos acordo com a indústria para que eles façam estágio nas empresas. Fizemos um portal em que as empresas podem encontrar os alunos, contratar para fazer P&D (pesquisa e desenvolvimento).

E existe um acompanhamento do que aconteceu com esses alunos na volta, em comparação com os que não foram?

Existe e isso é uma parceria que estamos fazendo com todas as reitorias acadêmicas, que monitoram o programa, para avaliar.

Existe já um relatório das avaliações?

Não tenho de cabeça, mas em geral a avaliação é muito positiva.

Em termos de quê?

Da atitude dos estudantes. Eles voltam muito mais motivados, muito mais focados no trabalho, com um projeto de vida, um projeto técnico-científico, mais dedicação ao estudo. Você abre um horizonte fantástico, eles voltam com muito mais garra para o desempenho. [Após a entrevista, o ministro enviou uma pesquisa de avaliação subjetiva do programa feita pelo Senado com bolsistas e ex-bolsistas. Enviou também pesquisas quantitativas que mostram impacto positivo do Pronatec para beneficiários do Bolsa Família e o estudo "Inclusão Produtiva Urbana: O que fez o PRONATEC / Bolsa Formação entre 2011 e 2014", também do Ministério do Desenvolvimento Social, mostrando aumento da empregabilidade de egressos do Pronatec ].

Faz sentido para o Brasil gastar tanto mais por aluno do ensino superior que com os do ensino básico?

É evidente que uma universidade é mais cara. Não adianta pensar a educação se não pensar de forma integrada. Sem boas universidades para inovar, fazer patentes, formar bons professores, técnicos, profissionais, o país não tem competitividade.

E na sua avaliação as universidades estão fazendo isso hoje?

Tivemos uma expansão muito grande, estamos fazendo uma reavaliação da metodologia de avaliação dos cursos de pós-graduação. Temos mais ou menos 6.500 cursos de pós-graduação, que produzem por ano hoje 500 mil títulos, livros e publicações em revistas especializadas e indexadas. Não se pode avaliar só pela métrica do volume e pelas citações. Estamos tentando introduzir uma dimensão maior da qualidade. Até março pretendemos concluir o estudo.

Citações não são uma medida de qualidade?

São um indicador, mas não pode ser o único.

Quais os outros?

É isso que estamos analisando, as experiências internacionais, para tentar introduzir.

O ministro Aloizio Mercadante em Brasília
É a favor de trazer OSs [organizações sociais, entidades privadas sem fins lucrativos que prestam serviços públicos] para gerenciar escolas públicas?

É uma experiência que tem que ser olhada rede por rede. É uma decisão da rede, tem que avaliar e verificar o resultado.

Em tese, o senhor é a favor?

Tenho muita simpatia pelas OSs em ciência e tecnologia e inovação. O Impa [Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada] é o quinto centro em matemática no mundo e é uma OS. Ele tem uma agilidade muito importante. Não conseguiríamos fazer o Enem se não houvesse parceria com OSs, que têm muita agilidade.

Tem que ter controle, transparência, contrato de gestão, tem que estabelecer contrapartida, mecanismo eficiente de gestão. Não é uma solução para tudo. Mas é um caminho.

E as "charter schools" [sistema em que o governo contrata escolas particulares]?

Vou aguardar, temos que tomar muito cuidado, pois essas são definições das redes. É preciso acompanhar, avaliar e à medida que forem exitosas a rede vai estar aberta a discutir. Vi algumas experiências de PPP para construção de equipamentos muito interessantes. A parte pedagógica é do Estado, mas a construção e a gestão são privadas.

As "charter schools" dão um passo além: a parte pedagógica é também da empresa contratada.

Nisso acho que perdemos a visão do direito do cidadão de qualquer escola pública ser responsabilidade do Estado. Os bons sistemas de educação do mundo tem professores estáveis e da rede pública.

Então o senhor é contra?

Não vejo necessidade. Não há consenso na literatura em relação aos resultados. É uma experiência piloto, nunca foi majoritária em nenhum lugar do mundo.

O sistema privado no Brasil pode disputar os alunos. No ensino médio, eles não têm aumentado. As boas escolas da rede pública estão sendo disputadas, não vejo necessidade desse caminho no Brasil.

É responsabilidade do Estado ter uma base comum, que todo aluno tenha um aprendizado que é o mesmo no país, é um direito essencial que tem que estar assegurado.

Luciano Netto - 13.jul.2006/Folhapress

Mercadante, candidato ao governo de SP, e Lula, candidato a presidente, na campanha eleitoral de 2006
Nas universidades, investimos um pouco mais por aluno, é verdade, mas as públicas são as melhores do Brasil. Essa ideia de que o Estado não pode dar boa educação não se sustenta nem empiricamente. Com criatividade e inovação, faz-se uma boa rede pública.

Na parte administrativa, agiliza, barateia. Mas o projeto pedagógico é um projeto de país, um projeto público. E um direito básico de todo cidadão.

E o ensino profissionalizante vai entrar na base comum?

Vejo grande simpatia por parte de todo secretário. A rede de ensino médio é basicamente estadual. Houve encontro em Manaus e vejo grande simpatia por parte dos secretários estaduais que uma parte da carga horária e da estrutura curricular seja técnica profissional.

O senhor vê com preocupação o aumento da influência do ex-presidente Lula no atual governo?

[pausa] O que você ia perguntar sobre educação, mesmo?

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

"Planalto enquadra petistas e insiste no apoio a Cunha", diz O Globo

Nota de O Antagonista

"A condenação sem provas do companheiro Eduardo Cunha"

"Planalto enquadra petistas e insiste no apoio a Cunha", diz O Globo.
Hoje à noite, Jaques Wagner terá um encontro com os deputados do partido, para combinar a estratégia de defesa de Eduardo Cunha.
A cartilha do PT, a partir de agora, inclui, entre os "vícios da Lava Jato", "a condenação sem provas do companheiro Eduardo Cunha".
Em búlgaro:
"Пороците на Lava Jet" "Conviction без доказателство половинка Eduardo Cunha".
Macri derrota kirchnerismo.
Candidato opositor é eleito presidente num país em crise econômica 

]
De O GLOBO  
por 

BUENOS AIRES - Depois de ter ficado em segundo lugar no primeiro turno da eleição presidencial argentina, em 25 de outubro passado, o candidato da aliança opositora Mudemos, o prefeito portenho Mauricio Macri, protagonizou uma reviravolta na política argentina e se elegeu como sucessor da presidente Cristina Kirchner. Com 99,17% das mesas de votação apuradas, Macri tinha 51,40% dos votos, superando seu adversário, o candidato do kirchnerismo, Daniel Scioli, que alcançou 48,60%.

Por volta das 21h30m (hora local), o candidato do kirchnerismo, de 58 anos, atual governador da província de Buenos Aires, cumprimentou o oponente:
— Foi eleito um novo presidente, o engenheiro Mauricio Macri, com quem acabo de falar por telefone e parabenizar. Sou democrata e respeito a vontade popular. Pedimos que Deus o ilumine para melhorar o que o país avançou.
O clima em Buenos Aires e outras cidades era de euforia e seguidores de Macri celebravam nas ruas.
— Obrigado por terem acreditado que, juntos, podemos construir a Argentina que sonhamos. Estou aqui porque vocês decidiram — discursou o presidente eleito. — É uma mudança maravilhosa, que deve nos levar ao futuro e às oportunidades que precisamos para crescer.

Macri vai encarar problemas delicados, como irregularidades e escassez de reservas no Banco Central; recessão; aumento da pobreza e desemprego; necessidade de normalizar o mercado cambial (sob intervenção do governo desde 2011); isolamento dos mercados internacionais e falta de um acordo com os chamados fundos abutres, que estão litigando contra a Argentina em tribunais americanos e, assim, impedindo que o país possa sair da situação de calote de sua dívida pública.
— Vocês hoje fizeram possível o impossível, o que ninguém acreditava, com seu voto — agradeceu Macri à multidão que o prestigiava, e aproveitando para mandar um recado aos perdedores. — Esta vitória não pode se deter em revanches e ajustes de contas.
O presidente eleito iniciou sua carreira política na virada do século, após presidir o Boca Juniors, time mais popular do país, e ter comandado empresas do império fundado pelo pai, o magnata Franco Macri.
A grande expectativa da oposição era superar os votos conquistados por Cristina, quando foi reeleita em 2011. Na época, a presidente alcançou 54,11%, superando amplamente os 22% obtidos pelo segundo colocado, o socialista Hermes Binner, e se tornando a terceira chefe de Estado mais votada da História argentina. O primeiro lugar é ocupado pelo general Juan Domingo Perón, que nas presidenciais de 1951 obteve 63,4%. Hipólito Yrigoyen, líder histórico da União Cívica Radical (UCR), eleito em 1928, com 61,66%, ocupa o segundo lugar.

CRISTINA TIROU FÔLEGO DE SCIOLI

No primeiro turno, em outubro, Macri ficou apenas três pontos percentuais abaixo de Scioli, desempenho que surpreendeu analistas e empresas de consultoria, que previram uma vantagem de até dez pontos percentuais para o kirchnerista. A aliança opositora se tornou um rival competitivo — até então se dizia que Macri não tinha chances de derrotar Scioli num segundo turno. E venceu disputas-chave, como o governo da província de Buenos Aires e mais de 70 prefeituras.
Após ser eleito prefeito portenho em 2007, e reeleito em 2011, com mais de 60% dos votos, Macri se tornou o grande rival do kirchnerismo nas urnas graças à aliança de seu partido, o PRO, com a tradicional UCR. O entendimento, que nasceu no começo deste ano e provocou muito debate interno na UCR, deu a Macri a estrutura nacional que o PRO não tinha e que sempre representou o principal obstáculo para sua candidatura presidencial.
Para Macri, de perfil empresarial, a vitória representa o desafio de governar um país com parte do peronismo na oposição, um fantasma que, segundo seus colaboradores, não o assusta. Outros ex-presidentes que não eram peronistas não conseguiram completar os mandatos, como Raúl Alfonsín (1983-1989) e Fernando de la Rúa (1999-2001).

— Para quem esteve 14 dias sequestrado e superou essa situação, não existe o impossível — comentou um assessor.
Em 1991, a família Macri pagou US$ 6 milhões pelo resgate do então empresário, que demorou algum tempo em se recuperar. O candidato não fala muito sobre o episódio, mas quem o conhece bem garante que foi traumático.
Scioli, que decidiu fazer política na década de 90 com o respaldo do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999), também teve de superar circunstâncias difíceis, como a perda de um braço na década de 80, quando era campeão de motonáutica. Após ter perdido fôlego na segunda etapa da campanha, segundo analistas, pela alta rejeição ao governo kirchnerista, o candidato apostou numa campanha do medo para tentar reverter a vantagem de Macri, sem sucesso.

sábado, 21 de novembro de 2015

'Descendentes precisam saber que história da África é tão bonita quanto a da Grécia'
Quando começou a se interessar pela história da África, o poeta, diplomata e historiador Alberto da Costa e Silva ouviu: "Por que você, um diplomata, um homem tão letrado, não vai estudar a Grécia?"
Justamente porque todo mundo estudava a Grécia, explica, ele resolveu estudar a África. Hoje, é o principal africanólogo brasileiro, autor de clássicos como A Enxada e a Lança: a África antes dos Portugueses e A Manilha e o Libambo: a África e a Escravidão, de 1500 a 1700. E, aos 84 anos, prepara um novo livro para completar sua trilogia sobre história africana.
Formado em 1957 pelo Instituto Rio Branco, Costa e Silva serviu em vários países e foi embaixador na Nigéria.
É membro da Academia Brasileira de Letras, autor e organizador de mais de 30 livros. Por sua obra, recebeu em 2014 o Prêmio Camões, o mais prestigiado da língua portuguesa.
Filho do poeta piauiense Antônio Francisco da Costa e Silva, nasceu em São Paulo e viveu no Ceará até aos 12 anos, quando mudou-se para o Rio de Janeiro. Cresceu entre livros e costuma dizer que, como no verso do poeta francês Charles Baudelaire (1821-1867), seu berço "ao pé da biblioteca se estendia".
Foi entre livros, quadros e esculturas, no apartamento em que guarda lembranças de vários lugares do Brasil e do mundo, que ele recebeu a BBC Brasil às vésperas do Dia da Consciência Negra para falar da história do continente pelo qual se apaixonou.

BBC Brasil: Como o Brasil aprendeu a história da África?

Alberto da Costa e Silva: A história da África durante muito tempo foi uma espécie de capítulo de antropologia e etnografia do continente africano. Eram livros que árabes e europeus escreveram sobre suas viagens. Data do fim da Segunda Guerra Mundial a consolidação a história da África como disciplina à parte, semelhante à história da Idade Média europeia, ou à história da China.
Entre 1945 e 1960 seu estudo começa a ganhar grandes voos, tanto na África quanto na Europa, sobretudo Inglaterra e França. Curiosamente o Brasil esteve ausente disso. Os historiadores brasileiros sempre viam a história das relações Brasil-África com a África figurando como fornecedora de mão de obra escrava para o Brasil, como se o africano que era trazido à força nascesse num navio negreiro.
Era como se o negro surgisse no Brasil, como se fosse carente de história. Nenhum povo é carente de história. E a história da África é uma história extremamente rica e que teve grande importância na história do Brasil, da mesma maneira que a história europeia.
De maneira geral, quando se estuda a história do Brasil, o negro aparece como mão de obra cativa, com certas exceções de grandes figuras, mulatos ou negros que pontuam a nossa história. O negro não aparece como o que ele realmente foi, um criador, um povoador do Brasil, um introdutor de técnicas importantes de produção agrícola e de mineração do ouro.

BBC Brasil: O senhor poderia citar alguns exemplos?

Costa e Silva: Os primeiros fornos de mineração de ferro em Minas Gerais eram africanos. Fizemos uma história de escravidão que foi violentíssima, atroz, das mais violentas das Américas, uma grande ignomínia e motivo de remorso. Começamos agora a ter a noção do que devemos ao escravo como criador e civilizador do Brasil.
Quando o ouro é descoberto em Minas Gerais, o governador de Minas escreve uma carta pedindo que mandassem negros da Costa da Mina, na África, porque "esses negros têm muita sorte, descobrem ouro com facilidade". Os negros da Costa da Mina não tinham propriamente sorte: eles sabiam, tinham a tradição milenar de exploração de ouro, tanto do ouro de bateia dos rios quanto da escavação de minas e corredores subterrâneos. Boa parte da ourivesaria brasileira tem raízes africanas.
Temos de estudar o continente africano não como um capítulo à parte, um gueto. A história da África está incorporada à história do mundo, porque ela foi parte e é parte da história do mundo. Que a história do negro no Brasil não seja isolada, como se o negro tivesse sido um marginal. O negro foi essencial na formação do Brasil.

BBC Brasil: Qual a importância de um personagem como Zumbi?

Costa e Silva: Havia um suplemento juvenil do jornal A Noite, sobre grandes nomes da história, e eu me lembro perfeitamente de um caderno sobre Zumbi. Zumbi está aliado de tal maneira à ideia de liberdade que é difícil escrever sobre ele sem ser apaixonado.
Zumbi não é um nome, é um título da etnia ambundo, significa rei, chefe. Palmares era como um Estado africano recriado no Brasil. Na África era muito comum isso. Em torno de um núcleo de poder forte se aglomeravam vários povos e formavam um novo povo. Isso é uma hipótese.

BBC Brasil: O senhor vê um aumento do interesse dos brasileiros pela questão negra?

Costa e Silva: Tenho a impressão de que todos temos dentro de cada um de nós um africano. Podemos não ter consciência disso, mas é permanente. Há naturalmente hoje em dia uma percepção mais nítida do que é a África, a escola começa a dar uma visão mais clara.
Mas ainda apresenta visões distorcidas. Uma vez uma professora veio me dizer que era absurdo que apresentássemos Cleópatra como uma moça branca, quando ela era negra. É um equívoco isso. Cleópatra não era negra nem mulata. Era grega. Os Ptolomeus, uma dinastia grega, governavam o Egito e não se misturavam.

BBC Brasil: Na África também havia escravos, não?

Costa e Silva: Escravidão houve em todas as culturas no mundo. Todos nós somos descendentes de escravos. Houve escravidão em toda a Europa, na Indonésia, entre os índios americanos, na Inglaterra. Na África havia todos os tipos de escravidão, e até hoje em certas regiões africanas os descendentes de escravos são discriminados. Quase toda a África teve escravidão.
A escravidão transatlântica, da África para as Américas, a nossa, tem uma diferença básica: pela primeira vez era uma escravidão racial. Era um especial aspecto da perversidade dela. No início não, mas a partir de certo momento, passa a ser exclusivamente negra. Foi o maior deslocamento forçado de gente de uma área para outra que a história já conheceu, e o mais feroz.
O Brasil foi o último país das Américas e do Ocidente a abolir a escravidão. O último do mundo foi a Mauritânia (na África), em 1981.

BBC Brasil: Como analisa o racismo hoje no Brasil?

Costa e Silva: Existe racismo, e muitíssimo. No nosso racismo, não temos um partido racista, mas temos repetidas manifestações de racismo no seio da sociedade. É dificílimo, para um negro, ascender socialmente. A discriminação se exerce de forma muitas vezes dissimulada, mas que os marca muito. Mas está mudando. Sinto mudanças.
É importante que os descendentes de africanos saibam que eles têm uma história tão bonita quanto a história da Grécia. Que eles não eram bárbaros, que não são descendentes de escravos. São descendentes de africanos que foram escravizados.
Para mim o importante não é que haja cota na universidade. Acho que tem de haver cota em tudo. Se você vai se candidatar a um cargo de atendente de hotel de primeira classe, se você for negro, você tem dificuldade. O preconceito é discriminatório. Ele não impede você de usar o mesmo banheiro, o mesmo bebedouro, mas dificulta o acesso (do negro) às camadas das classes média e alta.


                                          (Fonte: G1)
Lula é vaiado em Salvador e diz que PT criou oportunidades para negros
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi vaiado na tarde desta sexta-feira, 20, ao participar de um evento em comemoração ao Dia Nacional da Consciência Negra, na Liberdade, bairro de maior concentração populacional negra de Salvador (BA). Já no início da fala, com mais de duas horas de atraso, ao cumprimentar os presentes, de cima de um trio elétrico, Lula ouviu uma sonora vaia, seguida de reclamações relacionadas à crise financeira e à corrupção no País. 
Alguns gritavam a sua indignação com a volta da inflação e o desemprego. "Se soubesse que ele estaria aqui, eu não viria. O País em crise, os pobres passando dificuldade e esse cara aqui jogando conversa fora. Que falta de consciência. E ainda colocou aquela mulher na presidência", esbravejava Janete Costa dos Santos, de 25 anos, referindo-se à presidente Dilma Rousseff.
Lula tentou reverter a situação de descontentamento popular enumerando algumas conquistas obtidas pela comunidade negra durante o governo do PT. 
"Tenho consciência de que o que já foi feito são conquistas. Uma das grandes conquistas foi o estatuto da igualdade racial. Nesse século 21 tivemos momentos importantes na nossa história. Eu duvido que qualquer cientista político faça pesquisa para ver se em qualquer momento do País havia tantos negros e negras nas universidades", ressaltou, destacando as políticas públicas implementadas pelo PT, em benefício dos afrodescendentes.
"Eu sei que tem gente que não gosta da gente, sei que tem divergência. Queria que as pessoas que discordem de nós, colocassem a mão na cabeça e pensassem no que eram as negras e os negros antes do PT nesse País", disse, e reforçou que "nunca na história desse País o negro teve oportunidade de ser médico, engenheiro e não só ajudante de pedreiro nas grandes capitais ou empregadas domésticas. 
Em seguida, o ex-presidente admitiu que ainda há muito a ser feito". "O movimento negro precisa estudar quais são as conquistas que a gente deseja, pois a luta do povo é infinita". Ele se despediu como se estivesse em campanha: "Um abraço a todos e até a vitória".  

  (Fonte: Estadão)
Estado Islâmico proíbe aulas de Filosofia e Química
O Estado Islâmico (EI) proibiu aulas das disciplinas de Filosofia e de Química nos colégios da cidade síria de Al Raqqah e estabeleceu um "plano islâmico" para os centros educativos.
O Observatório Sírio de Direitos Humanos informou que o EI convocou vários diretores de colégios para uma reunião para "preparar um sistema islâmico de ensino nas escolas da cidade de Raqqah e arredores".
Os radicais exigiram que o plano de estudos esteja de acordo com o islã e seja revisado por especialistas de uma "junta educativa" que será formada pelo Estado Islâmico, e informou que serão acrescentadas matérias de acordo com a demanda.
Seus "especialistas islâmicos" decidiram excluir do programa educativo as disciplinas de Filosofia e Química com o argumento de que "não se adaptam às leis de Deus".
O EI prometeu aos professores e diretores uma remuneração adequada para realizar corretamente seus trabalhos educativos. O regime de Bashar al Assad se nega a pagar os salários depois de ter sido expulso pelos jihadistas.
O OSDH denunciou que o EI fechou várias escolas na província por diferentes razões, entre elas, porque o grupo se nega a aceitar um plano de estudos baseado no ensino do regime sírio ou das brigadas islamitas, que controlaram Raqqah antes dos radicais.
O EI controla Al Raqqah e grande parte de Deir ez Zor, onde várias tribos e organizações armadas juraram lealdade.
No final de junho, os jihadistas do Estado Islâmico estabeleceram um "califado" nos territórios sob seu controle no norte da Síria e no Iraque, e impuseram uma interpretação extremista da lei islâmica. 

                                               (Fonte: EXAME.com)

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Para Além da França...

    No ano de 2003 Os Estados Unidos resolvem invadir o Iraque e derrubar o Ditador Saddam Hussein. Sob o pretexto de que o Iraque possuía armas químicas de destruição em massa, os estadunidenses comandados pelo presidente George W Bush lançaram a beligerante ofensiva ao governo de Saddam, mesmo sem o consenso da comunidade Internacional. Achavam que era só derrubar o ditador iraquiano e implantar a democracia e estava tudo resolvido. Mas é a partir daí que o caldeirão explode.
    Saddam, que pertencia a corrente sunita do islamismo, foi capturado e seu governo caiu. Junto com o governo do ditador, os muçulmanos sunitas perderam poder e influência dentro da comunidade iraquiana e o grupo dos muçulmanos xiitas, que até então não tinham muitas oportunidades no Iraque de Saddam, tornaram-se a nova elite política do Iraque. 
    Com a retirada das tropas estadunidenses, os islâmicos sunitas não aceitaram perder o poder para os xiitas e passaram (os mais radicais) a organizar atentados terroristas para desestabilizar o novo governo xiita e recuperar sua importância dentro da comunidade local. 
    Com o passar do tempo, esses grupos de resistência sunita começaram a se organizar em algumas regiões do território iraquiano onde o poder central possuía pouca infraestrutura e influência e com viés vingativo emergiram, sob a liderança dos radicais sunitas, o Estado Islâmico.
    O Estado Islâmico interpreta o Al Corão (Livro Sagrado do Islã) de forma particular e radical, professando a criação de um novo Califado (viver e pregar o islã ao pé da letra como na época de Maomé) e colocando aqueles que não seguem sua crença como o inimigo que deve ser subjugado ou até mesmo eliminado.
    Os atentados na França mostram que o Estado Islâmico não ameaça apenas os povos da sua área de atuação, mas para todo o Mundo, devido ao seu caráter extremista, sanguinário e totalitário. E ainda é uma grande ameaça a principalmente a maior superpotência do globo - Estados Unidos, que foram os responsáveis indiretos do Estado Islâmico.
  Cabe lamentar ainda o patético papel que o Brasil vem desempenhando na Diplomacia Internacional, tanto no governo Lula quanto o governo Dilma, o Brasil vem tomando posições de aproximação com países com perfil totalitários como Irã, Ditaduras Africanas, Venezuela e de simpatia com grupos extremistas; recentemente a Presidente Dilma defendeu o diálogo como o Estado Islâmico, ou seja, conversar com quem mata indiscriminadamente. É por uma dessas que o Brasil hoje é considerado um “anão diplomático”.

          José Júnior, 18/11/2015

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