quinta-feira, 8 de setembro de 2016

"O tempo no STF é o tempo das lesmas" por Tosta Neto

Na clássica obra de filosofia política, Do Espírito das Leis, Montesquieu sacramentou a teorização sobre a divisão do poder em três instâncias. O filósofo iluminista fez uma incursão pela história antiga, com foco especial em Grécia e Roma, demonstrando o funcionamento de cada poder na estrutura de governo. Consoante Montesquieu, eis as atribuições dos poderes: Legislativo – legislar, criar as leis; Executivo – executar as leis, o exercício da administração; Judiciário – julgar se as leis estão sendo aplicadas de forma correta. Na análise do pensador francês, os três poderes devem ser harmônicos e equitativos, isto é, o poder freando o abuso do próprio poder. Do Espírito das Leis foi fundamental no âmbito do Direito Moderno, logo, o vigente Estado Democrático de Direito coaduna com os princípios clássicos da obra supracitada.
Na nossa constituição de 1988, a denominada “Constituição Cidadã”, o leitor atento encontrará várias passagens que remetem ao Do Espírito das Leis. No artigo em questão, centralizarei a abordagem na mais alta corte do Poder Judiciário no Brasil, o STF (Supremo Tribunal Federal), que nos derradeiros anos ganhou notoriedade graças a Ação Penal 470, o julgamento do funesto “Mensalão”. Com o agravamento da crise política, o processo de Impeachment de Dilma Rousseff e o envolvimento de políticos renomados no “Petrolão”, o STF ganhou um protagonismo sem precedentes na história do Brasil. Aparentemente, o STF não está se mostrando à altura da complexidade histórica que passamos, haja vista, a lentidão e a inoperância no julgamento de políticos com foro privilegiado.
No Brasil, é uma dádiva de Têmis ser réu no Supremo; se tu fores julgado pelo STF, tu terás a eternidade ao teu dispor, pois tu serás julgado somente após o fim da eternidade. Quem quiser julgamento de lesma, apele para ser julgado pelo STF. Não esqueçamos o longo período de 02 anos no julgamento da Ação Penal 470. Se o “Mensalão” foi duradouro, imagine o julgamento do “Petrolão”, este último, apresenta um número absurdo de políticos envolvidos. É mister acabar com o foro privilegiado, afinal, segundo a nossa constituição, no Art. 5º, atesta-se: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade [...]. É inconcebível que a classe política tenha tratamento especial. Qual é o porquê de tantos privilégios? Por acaso, os políticos são deuses?
Em contraposição à lentidão e inoperância do STF, a 13ª Vara de Curitiba, um simples órgão de 1ª instância, já aplicou várias penas. Em Curitiba, o processo anda, em Brasília, dorme e ronca em “berço esplêndido”. A “República de Curitiba” tem arrepiado as entranhas da classe política. Recentemente, em um dos áudios vazados na mídia, o ex-presidente Lula chamou os ministros do Supremo de “bando de covardes”. Não houve sequer uma nota do presidente do STF, Ricardo Lewandowski, rebatendo a afirmação de Lula. Se o Brasil fosse um país sério, o STF daria uma resposta à altura ao insulto do ex-presidente, que se autointitula “a alma viva mais honesta deste país”. É lamentável que o STF esteja de joelhos para Lula. Não esqueçamos os fortes vínculos entre Lula e Lewandowski e o passado petista de Dias Toffoli (ex-advogado do PT e de José Dirceu). O STF foi humilhado por Lula, que com sua perniciosa afirmação, escarrou no Estado Democrático de Direito.
O STF se mostrou omisso em momentos-chave da História do Brasil: o silêncio, a indiferença e a covardia no Estado Novo e no Regime Militar, períodos nos quais, exterminaram a liberdade política e muitos opositores. Ademais, precisa-se mudar a forma de composição do STF; sabe-se que os ministros são indicados pelo Presidente da República, depois são sabatinados pelos senadores. A indicação em questão revela uma leve intromissão do Executivo no Judiciário; a composição do Supremo, dependendo das circunstâncias, quiçá siga os interesses do Presidente da República. A indicação política pode “contaminar” um julgamento, vide a visível atuação de Lewandowski como advogado dos petistas na Ação Penal 470, é tanto, que o Excelentíssimo Ministro foi admoestado várias vezes por Joaquim Barbosa. O STF não pode ser mais um “puxadinho do Planalto”, como diria o historiador Marco Antonio Villa.
Numa democracia, o mérito deve ser a prerrogativa primordial e determinante para que um magistrado ingresse na Alta Corte. O STF necessita reinventar-se e estar apto a responder as turbulências da história e do funcionamento do Estado Democrático de Direito, além de fazer jus ao status de corte soberana do Poder Judiciário, afinal, seu desempenho é imprescindível ao progresso da nação e à “saúde” do Estado.


                                                                        Tosta Neto, 08/09/2016

Um comentário:

  1. Excelente! O texto demonstra erudição e clareza notáveis em seus argumentos. Concordo com as questões levantadas, sobretudo no que tange à falta de celeridade e rigidez necessárias que permitam que a nossa mais alta corte possa ser uma grande protagonista nesse momento histórico tão relevante do nosso país. Não por acaso, muitos desejam o foro privilegiado para escapar mais facilmente das garras da justiça (nosso ex-presidente Lula que o diga na famosa conversa grampeada com a também ex-presidente Dilma).

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