terça-feira, 29 de dezembro de 2015

"Cinzas no paraíso" por Fernando Gabeira

O Supremo no Brasil talvez seja o único que toma as decisões em transmissões ao vivo. Dizem que é uma jabuticaba pois só dá no Brasil. Pelo menos é uma jabuticaba do bem, pois tem o gosto doce e esquisito da transparência.
O fato de os ministros estarem tanto tempo na tela, convivendo no mesmo espaço luminoso com centenas de outros personagens, talvez os jogue nessa teia de familiaridade com os espectadores. Lewandoswki, por exemplo, é um atacante do Bayer que costuma jogar nos dias de sessão no Supremo. Você muda o canal e Lewandoswki é um tremendo zagueirão, em defesa das teses do governo.
Nem sempre tenho tempo para ver tudo, mesmo nos momentos wagnerianos. Confesso que, às vezes, me parecem prolixos, redundantes, mas o que fazer, movem-se com uma linguagem especifica.
Talvez seja um problema pessoal. Desde garoto, escrevendo para jornal, a luta diária com as palavras exige clareza e uma certa rapidez. Quase nunca se consegue a satisfação. Mas há um anjo sempre lembrando: olhe para a frente, no próximo, quem sabe.
A barreira retórica é uma das dificuldades para se entender essa Corte. Não afirmo ainda que seja bolivariana. A corte bolivariana não surpreende nunca. Suas decisões são sempre a favor do governo.
A corte brasileira apresentou algumas surpresas no papel dos atores embora o resultado tenha sido favorável ao governo. Uma delas foi o voto de Edson Fachin e Dias Toffoli. Ambos são considerados simpáticos ao PT. Celso de Melo, Cármen Lúcia, Marco Aurélio atropelar o parlamento.
Numa das férias, quando as tinha, tentei me aproximar do mundo das leis apoiando-me num volume das conferências de John Rawls. As férias acabaram antes do livro, mas por coincidência, marquei no texto lido, uma questão interessante. Por que certas questões e direitos estão fora do alcance das maiorias legislativas ordinárias?
Não creio que o impeachment precisasse regular detalhes do impeachment. Aconteceu o que é muito comum no país do futebol: apitaram perigo de gol. De novo.
Uma corte bolivariana é uma afirmação do cinismo, pois já determinou, antecipadamente, quem vai ganhar.
Está lá no livro de John Rawls:
— O que os cínicos dizem sobre princípios políticos éticos e ideais não pode ser correto. Se fosse, a linguagem e vocabulário que se referem e apelam a esses princípios, há muito tempo teriam deixado de existir. O povo não é estúpido a ponto de não perceber quando essas normas são usadas por líderes e grupos de uma forma manipulativa.
De John Rawls a Lewandoswki, o zagueiro, é mais do que mudar de canal. Um me faz sentir cidadão, outro me faz sentir enganado.
Com 16 anos de Parlamento, como posso aceitar, o argumento de que os deputados devam votar numa chapa única para comissão do impeachment? Como me convencer, se até para a escolha da presidência da Câmara há chapa avulsa? Em que comissão da câmara não se permite isto? De repente, aparece um grupo de capa preta e subtrai um direito minoritário, ao vivo e em cores?
Felizmente, tive calma e energia para mergulhar no trabalho e sonhar com uma corte que me surpreenda, não com a variação dos atores, mas com os vereditos finais.
Visitei a Chapada Diamantina em chamas. Perdemos 55 mil hectares de uma das mais ricas e diversas regiões do Brasil. No meio da fumaça e do calor infernal, descobri as brigadas voluntárias da pequena cidade de Lençóis, gente que deixou tudo para apagar o fogo. Essas brigadas são importantes. Elas se antecipam ao governo, combatendo os primeiros focos. E pressionam para que a máquina oficial entre em combate.
As chamas na Chapada Diamantina lembram-me o filme de Terence Malick; “Cinzas no paraíso” (“Days of Heaven”). As imagens de mestre Nestor Almendros o crepitar das chamas parecem uma cerimônia fúnebre, a cremação da mata e dos bichos.
Seca prolongada e as chuvas intensas no Sul: quando a Nasa previu que El Niño seria intenso, era necessário um projeto nacional para reduzir seus danos. Não houve. Com a eclosão do vírus da Zika, outra gigantesca força tarefa é necessária. Também não saiu.
Alguns voluntários, na Chapada combatem sem botas e de camiseta. Às vezes, as fagulhas os faz contorcer como se estivessem recebendo um santo.
Talvez sejam orixás que os mantêm vivos no combate ao fogo. De qualquer forma, é a força estranha que nos impulsiona na planície. Que ela venha no Ano Novo e o faça acontecer: 2015 resiste em acabar.
Em certas partes do ano, costumo estar de boa vontade com o mundo e as pessoas. É o que se chama de espírito natalino, embora nem sempre aconteça no Natal. Quando há desencontro de época e estado de espírito, o Natal é um pouco aborrecido. Este ano, meu espírito natalino coincidiu com o Natal. Isto amenizou o desencanto que tive com o Supremo, ao decidir pelo Parlamento quais são as regras do impeachment.

                                                                               (Fernando Gabeira / Fonte: O Globo)
"O pensador: uma breve análise sobre o futsal" por Tosta Neto
   Há tempos o Brasil não é mais o “país do futebol” (vulgo futebol de campo). Nos últimos anos, surgiu uma entressafra de bons jogadores. Outrora, presenciava-se um número significativo de craques, status que concedia papel de protagonismo ao jogador brasileiro no cenário internacional. O último futebolista do Brasil que conquistou a “Bola de Ouro” da FIFA foi Kaká, no distante ano de 2007. Em tempos hodiernos, o ex-país do futebol se sustenta exclusivamente no mito de Neymar como possível candidato a melhor jogador do mundo; mito inventado e cevado pela mídia esportiva, sedenta por craques que propulsionem a audiência e o marketing de grandes empresas. Este período de “vacas magras” teve como culminância o homérico 7 x 1.
   A frieza dos números mostra que o Brasil é o país do futsal (heptacampeão mundial). Eu disse hepta, sim, hepta, o nosso futsal superou o fetiche do “hexa”. A verdadeira seleção brasileira conquistou o campeonato mundial em 2012 num jogo disputadíssimo e apoteótico contra a forte seleção da Espanha. No futsal brasileiro inexiste a supracitada entressafra, cuja liga nacional ostenta um nível técnico deveras elevado, nível que não é perceptível no falido e monótono Campeonato Brasileiro da Globo.
   O futsal é um esporte praticado em espaço curto, assim, o atleta precisa ter raciocínio rápido no desenvolvimento das jogadas. No futsal, os erros são imperdoáveis e capitais, resultando na maioria das vezes, na consumação máxima: o gol. Os dribles são curtos e a dinâmica de jogo é acentuada. A prática do futsal exige agilidade de pensamento. O pensar é condição a priori para o grande jogador de futsal. Talvez, o futsal seja a paráfrase perfeita do xadrez entre as diversas modalidades de futebol.
   O autor que vos escreve é persuadido pela memória a destacar o nome de Tarcisio, atleta amargosense de futsal. Tarcisio não joga futsal com o corpo, outrossim, joga com o cérebro. Tarcisio não é jogador de futsal, é o pensador no futsal. Se os jogadores midiáticos da CBF tivessem o talento natural de Tarcisio, o nível técnico do futebol brasileiro não estaria em plena decadência. O pensador não é futebolista profissional por mero capricho do destino.
   O pensador tem olhar de águia, enxerga espaços obscuros para jogadores simplórios. Apesar da baixa estatura, o pensador é rápido como um guepardo, dificultando a marcação dos adversários. Também, o pensador apresenta um eficiente poder de finalização, todavia, a sua principal virtude é o fator surpresa, este último, desmonta as defesas mais consistentes. Surpreender é primordial para alcançar o triunfo, pois é um elemento que não está presente no leque da previsibilidade. Em momentos nebulosos e difíceis, o ato de surpreender atrelado ao pensamento, é um caminho seguro até a conquista da vitória. Por conseguinte, os Grandes Gênios das diversas áreas da ciência e do esporte, conjugaram e conjugam com maestria os verbos surpreender e pensar. É preciso surpreender! É preciso pensar!   


Tosta Neto, 20/01/2015

Sobre o Autor:

Tosta Neto é Escritor, Historiador e Colunista no Outro Olhar .

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

 Jornal Nacional 22/12/2015: Sobre o Caos com o SUS no Estado do RJ.

 'A nossa indignação é mais humana que todo o nosso amor.'

Foi noticiado ontem (22),  em reportagem  do  JN  intitulada; "Crise financeira do estado do Rio tem reflexos graves na rede de saúde", mostrando o completo  caos do SUS no Rio de Janeiro. 

Vale lembrar que é no mesmo Estado  onde o SUS esta em falência que, será realizado os Jogos  Olímpicos  de 2016,  Jogos que  em quatro anos, os gastos previstos pela organização saltaram de R$ 4,2 bilhões para R$ 7 bilhões,  bem como não se pode esquecer que o governador do estado do RJ, e o prefeito da capital do carioca, ambos são do PMDB , e  defensores ferrenhos do Gov. Dilma.  

Fica a interrogação; ao nos depararmos com este grotesco descaso do (des) serviço que acomete a este drama o povo do Rio,   o que  nós  resta  pensar e sentir?  Cabe a nós fechar os olhos ,  e  aclamar  a  hipocrisia da vez  ,'Viva as Olimpíadas',  ou o que reste fazer transparecer em nós o  pertinente sentimento de  INDIGNAÇÃO que esta crise de prioridade merece ??? Força Povo Carioca, avante Povo Brasileiro!

ASSISTA  ABAIXO 

(Vídeo-Conteúdo do  JN)

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

VÍDEO: Especialistas analisam os 13 anos de governo do PT
Depois de distribuir renda como em nenhum outro período da história, o PT, envolto em corrupção, sofre o impeachment após levar o Brasil a uma de suas maiores crises econômicas.          (Conteúdo de TV FOLHA )
atualizado 6/11/2016
                                               ASSISTA ABAIXO


(Conteúdo de TV FOLHA DE SÃO PAULO)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

 "Semana para o Planalto comemorar"ÁUDIO CBN, por Renata Lo Prete

Governo colheu vitórias fáticas importantes no STF e na relação com o PMDB

Rito definido agradou principalmente por exigir voto aberto e dar palavra final do Senado. Outra boa notícia para Dilma é a volta de Leonardo Picciani à liderança peemedebista na Câmara. Mesmo sem resolver problemas econômicos, já há um alívio.
(Conteúdo de CBN)

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

"Como é que um negro, pobre e gay decide ser liberal?"
Fernando Holiday é negro, gay e pobre. Mora na periferia. A mãe é auxiliar de enfermagem, e o pai é garçom.

Setores da imprensa tentam esmagar aquilo que não entendem. Fazem pouco caso do que está fora da caixinha confortável dos seus preconceitos. E o Movimento Brasil Livre é o alvo principal desse rancor. Entendo o desconforto. Não é todo dia que se lida com jovens com uma bibliografia razoavelmente maior do que a da maioria dos jornalistas que, em tese ao menos, deveriam explicá-los ao leitor. Aí, sabem como é… Em vez de entender o que se passa na realidade, tarefa de um jornalista, melhor chamar a fonte de “otária”.

Kim Kataguiri, 19 anos, a face mais visível do MBL, irrita muita gente, já percebi — sobretudo porque mobiliza um número infinitamente maior de admiradores. É inteligente, carismático e sabe ser engraçado. Renan Santos, 31, um jovem notavelmente articulado e informado, provoca a fúria dos imbecis. E, mais do que os dois, há outro líder do MBL que leva os pançudos de esquerda a ter borborigmos estertorosos. Falo de Fernando Silva Bispo, conhecido por Fernando Holiday. Ele tem 18 ou 19 anos.

O rapaz é dono de uma retórica poderosa. Já o tinha visto na Internet. Eu o conheci pessoalmente no dia 29 de novembro. Participei de um papo sobre liberdade de imprensa no Primeiro Congresso do MBL, que reuniu umas 400 pessoas do Brasil inteiro.

Um jornalista chegou a ligar para Renan para fazer uma “reportagem”. Primeira pergunta: qual era a percentagem de negros do encontro? Segunda pergunta: “Vocês estão ganhando dinheiro vendendo Pixulecos?”. Nota: naquele dia, o MBL há havia feito oficinas e discutido em vários grupos de trabalho, entre outras miudezas, configuração do estado brasileiro, programas sociais e distribuição de renda, reparação social e cooptação política…

Renan mandou o repórter ir pastar e disse que tinha mais o que fazer. Adiante.

Fernando Holiday é negro, gay e pobre. Mora na periferia. A mãe é auxiliar de enfermagem, e o pai é garçom. O garoto fala com uma fluência e com uma clareza como raramente vi. Fez naquele dia 29 uma síntese dos trabalhos do Congresso impressionante. Ele pensa bem. Ele fala bem. Ele é senhor de si.

Abaixo, há um vídeo de um pequeno discurso que ele fez no Congresso Nacional. Vale a pena assistir. Volto em seguida.

Destaco um trecho de sua fala:
“A esquerda que governou este país só sabe reclamar, só sabe se vitimizar. Mas eu quero dizer que eu, como negro, como pobre, como homossexual, não me vitimizo. Eu venho aqui, eu vou a qualquer lugar, porque eu quero lutar, eu quero alcançar o meu sucesso, não me rastejar atrás do estado.”

Pois é… Como conviver com isso, não é mesmo?

Não! O fato de Fernando ser negro não o torna nem mais nem menos habilitado intelectualmente para falar de cotas. O fato de ser gay não o torna nem mais nem menos habilitado intelectualmente para falar de diversidade sexual. O fato de ser pobre não o torna nem mais nem menos habilitado intelectualmente para falar das políticas de distribuição de renda.

Fernando fala sobre cada uma dessas coisas como indivíduo que está no mundo, debatendo políticas públicas, e não aceita que o condenem a um nicho da militância. Afinal, os jornalistas branquinhos da esquerda chique aprenderam que gente como ele tem é de estar em movimento social do PT. Que ousadia um negro pobre e gay ser aquilo que eles próprios não são: um liberal!!!

O rapaz dá um nó na cabeça da turma. Afinal, eles são esquerdistas pensando justamente em pessoas como Fernando. É um horror que um negro gay e pobre não deixe os branquinhos de boa consciência esmagá-lo com a sua mão piedosa! É um absurdo que um negro gay e pobre não vá procurar a proteção de Guilherme Boulos, o branco bem-nascido de esquerda, que vai render os seus ditos sem-teto aos pés de Dilma na quarta-feira.

Caramba! Essa gente toda gostaria de ensinar Fernando a ser um bom negro, um bom gay e um bom pobre.

Há algo de profundamente novo e auspicioso no país quando Fernando Holiday fala. E há algo de profundamente errado com a imprensa quando não percebe isso.

Eu me despedi de Fernando naquele domingo assim: “Eu quero votar em você para vereador, pouco importa o partido em que você esteja”. Nem sei se ele tem um. Nem sei se vai se candidatar. Mas eu gostaria muito de votar nele.
Acordem, Carolinas! O mundo está passando na janela, e só os partidários de Chico Buarque não veem.
por Reinaldo Azevedo, para a Jovem Pan

domingo, 13 de dezembro de 2015

Esperando o japonês

Falar do Brasil e da crise tem prioridade para mim

Quando voltava da padaria, empurrando a bicicleta, fui abordado, de forma simpática, por um leitor. Por que escrevia apenas sobre Dilma e o governo? Não é um simpatizante do PT, muito menos de Dilma. Mas fixar-se nisto, de uma certa forma, reduz o vasto horizonte cultural, disse. Respondi que concordava com ele. Mas, no momento, não conseguia me esquecer da crise em que nos metemos. No caminho de casa, pensei: poderia estar escrevendo sobre Clarice Lispector, Frida Kahlo ou mesmo Simone de Beauvoir. Para ficar apenas nas que voltaram à evidência.

Clarice foi uma das admirações literárias da juventude, e agora seus contos são reconhecidos nos Estados Unidos. Frida Kahlo, cuja casa, transformada em museu, na Cidade do México, tornou-se um ícone popular. E a velha Simone reapareceu no vestibular do Enem. Hoje tenho algumas divergências. Mas seu livro “O segundo sexo” inspirou um artigo que publiquei no “JB”, na década dos 1960, com título “Amélia não era mulher de verdade”. Isso posso deixar para o próximo Enem.

Falar do Brasil e da crise tem prioridade para mim. Dilma, o leitor que me desculpe citá-la de novo, é presidente. É impossível ignorá-la, nesse momento. Felizmente, outros colunistas escrevem sobre a cultura mais ampla. Isso me enriquece como leitor. Pessoalmente, no entanto, não consegui achar a porta de saída da política.

É possível abandonar com gosto campanhas eleitorais, tramas partidárias, gravatas e mandatos. Difícil para mim é esquecer a política, sobretudo no momento em que o país, de uma certa forma, se desintegra. Escrevo artigos depois de trabalhar ao ar livre, filmando temas como o desastre de Mariana ou o surto de microcefalia. Isso faz sentido para mim. No entanto, à noite, diante da tela em branco, não resisto ao desejo de buscar um sentido maior, uma esperança. Sonho com o tempo de uma democracia madura, que me permita cuidar de todas as outras coisas, não diretamente ligadas à política.

Isso não virá tão cedo. Terá de ser conquistado. No momento, ainda há uma hesitação em encarar a realidade. A crise sanitária que vivemos é uma das mais sérias de nossa história. Houve outras, mas as pessoas ainda não viviam tão próximas e tão precariamente nas regiões metropolitanas. Estou pronto para esquecer divergências quando se trata de uma frente para encarar as novas ameaças que o vírus do zika revelou. Ou mesmo uma frente para encarar as ameaças ambientais que o desastre de Mariana dramatizou.

Tudo se passa com um governo paralisado. Mesmo os que apoiam Dilma sabem que é fraca. E não é apenas fraca como é fraco um governo que não deu certo. É também vulnerável. Se o impeachment não vier com as pedaladas fiscais, outros fronts vão se abrir. No TSE serão julgadas suas contas, certamente entrelaçadas com os recursos do mensalão. Na Lava-Jato, Cerveró está revelando como se comprou Pasadena.

Que tipo de arranjo o Brasil precisa encontrar para chegar a 2018 e inaugurar uma nova etapa, a partir das eleições presidenciais? Em Brasília, para sentir o clima do impeachment de Dilma e a cassação de Cunha, senti na verdade um clima de fim de mundo. Colhido por um tumulto e empurrões em pleno trabalho de documentar a tentativa de votação da deputada Mara Gabrilli. Ao vê-la indefesa na cabine, com meus óculos voando do bolso, compreendi que a crise chegou aqui de forma devastadora.

Minha hipótese é de que o vírus que reduz cérebros em Brasília nasce de uma doença fatal: distância do país, das pessoas que trabalham e sofrem.

Depois do quebra-pau, alguns diziam: mas na Coreia do Sul também brigam. No Estado Islâmico se fuzila, em alguns países da África amputam clitóris, se o cérebro continuar se estreitando, chegaremos lá. Tudo isso é o fruto da cultura dos últimos anos. A história passa a ser um álibi: no governo anterior também se roubava. Agora é a geografia: na Coreia do Sul também brigam.

Dia seguinte: chovia dinheiro no Recife, lançado das janelas da Hemobras. O que seria isso? Uma forma de combater o mosquito atropelando-o com maços de notas? Trabalham com o suprimento de sangue e acumulam fortunas. O que fazer? Está no DNA do aparelho petista. Saio de Brasília com a impressão de que, antes do carnaval, nada será decidido a respeito de Dilma e Cunha. Talvez tenha sido por isso que alguns deputados no plenário cantaram a marchinha do Japonês da Federal, aquele que aparece prendendo os corruptos em suas casas. “Aí meu Deus, me dei mal, bateu à minha porta o Japonês da Federal”.

Lama jorrando das barragens, mosquitos roubando a chance de plena vida a uma geração de brasileiros, rubro dinheiro do sangue jorrando pelas janelas de Recife. Apesar disso, não perdemos o humor. Mas, às vezes, bate uma tristeza. A experiência, no entanto, me consola. Na campanha das diretas também entramos num ritmo morto, fomos derrotados na votação parlamentar. Mas as diretas chegaram.

Como dizia Guimarães Rosa: “O que tem de ser tem muita força”. Bem que podia ser mais rápido.
(por Fernando Gabeira em O GLOBO)
Angela Merkel é eleita “personalidade do ano” pela revista Time
A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, foi eleita a pessoa do ano de 2015 pela revista norte-americana “Time”. O anúncio foi feito nesta quarta-feira (9).
"Por pedir mais de seu país que a maioria dos políticos ousariam, por se manter firme contra a tirania e por proporcionar liderança moral em um mundo em que isso está em falta, Angela Merkel é a Personalidade do Ano da Time", escreveu a editora Nancy Gibbs.
É a primeira vez em quase três décadas que uma mulher foi eleita a pessoa do ano pela revista. A última vez que isso aconteceu foi em 1986, quando a então presidente das Filipinas, Corazon Aquino, primeira mulher a ocupar o cargo, foi escolhida.
Com 61 anos, Merkel é chanceler alemã desde 2005 e é considerada a mulher mais poderosa do mundo.
"Estou certo de que a chanceler verá isto como um encorajamento para acelerar seu trabalho político pelo bem da Alemanha e da Europa", reagiu pouco depois do anúncio um porta-voz de Merkel, Steffen Seibert.
Os outros finalistas foram:
- Abu Bakr Al-Baghadadim, líder do grupo jihadista Estado Islâmico;
- Donald Trump, pré-candidato republicano à presidência dos EUA;
- "Black Lives Matter" ("vidas negras importam"), campanha contra o racismo
- Hassan Rouhani, presidente do Irã;
- Travis Kalanick, CEO do serviço de compartilhamento de carros Uber;
- Caitlyn Jenner, atriz, modelo, ex-atleta olímpica e personalidade americana transexual.

Escolha
Merkel se viu envolvida durante todo o ano em um papel chave e de liderança na crise migratória na Europa, no problema da dívida europeia e teve atuação determinante na intervenção russa na Ucrânia.
“Em um momento em que boa parte do mundo está envolvida em um furioso debate entre o equilíbrio entre segurança e liberdade, a chanceler está pedindo muito dos alemães, e por seu exemplo, de todos nós. Para sermos receptivos. Para não termos medo. Para acreditar que grandes civilizações constroem pontes, e não muros, e que guerras são vencidas tanto dentro quanto fora do campo de batalha", disse a revista.
"Ao ver os refugiados como vítimas a serem resgatadas, ao invés de invasores a serem repelidos, a mulher criada atrás da cortina de ferro apostou na liberdade. A filha do pastor usou a misericórdia como arma. Você pode concordar com ela ou não, mas ela não está usando o caminho mais fácil. Líderes são testados apenas quando as pessoas não querem segui-los".
A Alemanha registrou a chegada de mais de 960.000 migrantes durante o ano procedentes de Síria, Iraque e Afeganistão, palcos de conflitos que já duram mais de dez anos, em alguns casos.
Em meio ao debate aberto pelos que consideram que a Europa era invadida por este fluxo de pessoas, Merkel adotou uma posição audaz convocando seu país a se mostrar solidário e dar o exemplo com estes demandantes de asilo.
Em 2014, a revista elegeu as equipes de saúde que combateram o vírus ebola na África como “pessoa do ano”. A designação da "Personalidade do Ano" é uma tradição anual da Time desde 1927. A figura eleita ocupa a capa da edição de fim de ano da revista.

                                                                                                                         (Fonte: G1)
Máscara de Tutancâmon pode ter sido feita para a rainha Nefertiti, diz arqueólogo
Um dos tesouros mais icônicos do Egito antigo - a grande máscara de ouro de Tutancâmon - pode não ter sido feito para o faraó. Segundo novo estudo do arqueólogo britânico Nicholas Reeves, o objeto foi feito originalmente para uma mulher, provavelmente, a rainha egípcia Nefertiti. De acordo com a pesquisa, publicada na última edição do periódico Journal of Ancient Egyptian Interconnections, o episódio tem ampla importância histórica, pois, além de a máscara ser considerada um objeto de grande importância cultural, ela também poderá ser vista como o símbolo da primeira luta ideológica conhecida entre monoteísmo e politeísmo.
A evidência, encontrada por Reeves, que sugere que a grande máscara mortuária de ouro de Tutancâmon tenha sido feita originalmente para Nefertiti, apareceu após um exame detalhado de uma inscrição no artefato. A análise mostrou que o hieróglifo que continha o nome de Tutancâmon, na verdade, foi escrito sobre outro texto, o título completo e oficial usado por Nefertiti após ela ter se tornado a "co-faraó" do Egito. A nomenclatura antiga dizia "Ankhkheperure-Meryt-Neferkheperure Neferneferuaten" (em tradução livre, "Manifestação viva do Deus Sol, Amada de Aquenáton e Beleza do Sol").
Além disso, segundo o arqueólogo, outros tesouros que estão na tumba de Tutancâmon - estatuetas e os caixões que guardam o corpo e os órgãos do faraó - também podem ter sido feitos, inicialmente, para outros membros da realeza antiga, como Nefertiti.
A máscara da rainha - De acordo com os cientistas, a resposta por que a máscara da rainha foi entregue ao faraó provavelmente reside na difícil situação política que ocorreu no Egito, durante o colapso de um experimento monoteísta que ocorreu há cerca de 3.350 anos. Nefertiti, a possível "proprietária" da famosa máscara mortuária de ouro de Tutancâmon, era a esposa do líder que promoveu a revolução monoteísta, o faraó Aquenáton. Segundo investigações, existe a probabilidade de que a rainha também tenha sido uma das responsáveis pela tentativa de reforma religiosa no país conhecido por seus vários deuses.
As pesquisas indicam que, uma década após Aquenáton e Nefertiti lançarem a revolução religiosa, o Egito teria sido atingido por uma terrível epidemia. Desesperado para assegurar a continuação da nova religião monoteísta e, talvez, com medo da morte, o faraó decidiu nomear sua esposa, Nefertiti, como a co-regente.
Após alguns meses, vítima da epidemia, Aquenáton morreu. Na época, o filho dele de oito anos, Tutancâmon, tornou-se faraó, mas Nefertiti continuou atuando como rainha. Durante esse período, ela tentou encontrar um meio-termo entre o sistema politeísta antigo e o monoteísta novo, mas morreu em três anos.
Entretanto, Nefertiti havia feito os preparativos para a sua própria morte, pois esperava ser enterrada como um faraó do Egito, com a máscara mortuária de ouro faraônica. Mas, após o falecimento da rainha, dois generais de orientação religiosa tradicional tomaram o poder egípcio, manipulando Tutancâmon e obrigado o faraó a abandonar a tentativa de reforma religiosa para retornar ao politeísmo tradicional.
Sendo assim, essa nova evidência sugere que a máscara mortuária de Nefertiti nunca foi usada em seu funeral ou em seu túmulo - foi armazenada e, posteriormente, "reciclada" para ser utilizada em Tutancâmon. Por isso, se a teoria for confirmada, além de ser um objeto histórico e artístico, a máscara também poderia se tornar um símbolo que retrata o que pode ter sido a primeira luta religiosa entre o monoteísmo e o politeísmo.
Além disso, segundo Reeves, outros tesouros que estão na tumba de Tutancâmon - estatuetas e os caixões que guardam o corpo e os órgãos do faraó - também podem ter sido feitos, inicialmente, para outros membros da realeza antiga, como Nefertiti.
A câmara secreta - A busca pela rainha na tumba de Tutancâmon teve início após a publicação, em julho, de um estudo de Reeves, em que ele afirma que, ao observar alguns detalhes das paredes da sepultura do faraó notou que elas poderiam abrigar duas câmaras secretas que foram fechadas e camufladas. Uma delas guardaria a múmia de Nefertiti, que viveu entre 1380 a.C e 1345 a.C, e foi conhecida por sua beleza. A outra seria uma sala de armazenamento.
Em 22 de outubro, autoridades permitiram o uso de radares durante a busca, porque esse tipo de tecnologia não afeta o estado dos muros interiores do sepulcro. Além disso, segundo Mamduh al Damati, ministro de Antiguidades egípcio, se as câmaras forem encontradas, essa poderia ser "a maior descoberta arqueológica do século".
Rainha misteriosa - Em setembro, Reeves viajou até o Vale dos Reis, em Luxor, para participar de inspeções que ajudariam a confirmar a localização da múmia da rainha. As ranhuras previstas por ele em seu estudo foram encontradas no fim de setembro. Damati afirmou em outubro que espera que o enigma sobre a possibilidade de encontrar a tumba de Nefertiti por trás da de Tutancâmon seja resolvido antes do final do ano. O ministro também se mostrou seguro de que exista "algo" por trás da câmara do jovem faraó, embora tenha deixado dúvidas sobre o fato de que seja o sepulcro da rainha do Antigo Egito.

Segundo Damati, outras duas mulheres egípcias poderiam estar enterradas em câmaras dentro da tumba de Tutancâmon: a rainha Meritaton, filha e mulher de Aquenaton, ou Kiya, mãe de Tutancâmon.
                               (Fonte: Veja)
Lula é intimado a depor em investigação sobre seu filho
Brasília - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi intimado pela Polícia Federal a depor em uma investigação de suborno envolvendo seu filho Luís Cláudio, de acordo com um documento de intimação obtido pela Reuters.  
Lula não está sob investigação, mas será interrogado sobre a suspeita da polícia de que um pagamento de 2,5 milhões de reais para uma empresa de Luís Cláudio poderia ter sido suborno para influenciar a aprovação de legislação favorecendo empresas do setor automotivo.
A intimação de 1º de dezembro determina que Lula compareça à sede da PF em Brasília na próxima quinta-feira para "prestar esclarecimentos". A intimação foi entregue à Reuters por uma fonte próxima da investigação.
O Instituto Lula informou que ele não foi notificado oficialmente a depor, mas que estará "à disposição das autoridades".
"A Medida Provisória em questão foi editada e aprovada pelo Congresso em 2013, quando ele não era mais presidente da República", disse o instituto em nota.
A PF fez buscas nos escritórios de uma empresa de propriedade de Luís Cláudio em 26 de outubro, como parte da Operação Zelotes, que investiga fraudes em julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). De acordo com declarações da PF na época, evidência de suborno, extorsão e tráfico de influência levou à operação.
"O ex-presidente não tem qualquer relação com tais fatos, mas se notificado irá prestar esclarecimentos", disse o advogado Cristiano Zanin Martins do escritório Teixeira, Martins & Advogados, que representa a família Lula.     O ex-presidente é alvo de investigação da Procuradoria da República no Distrito Federal por suposto tráfico de influência depois que deixou o cargo em 2010 como o presidente mais popular do Brasil.
Na quarta-feira, um juiz autorizou um pedido da polícia para quebrar os sigilos bancário e fiscal da empresa LFT Marketing Esportivo, de Luís Cláudio, e do ex-ministro do governo Lula Gilberto Carvalho.

                                                        (Fonte: Exame.com)

sábado, 12 de dezembro de 2015

AMARGOSA FM TERÁ KLEBER PASSO COMO NOVO CORRESPONDENTE

A rádio Amargosa FM terá correspondente, a partir de 2016.

Kleber Passo estreitará como novo correspondente colaborador na Rádio Amargosa FM, em 2016. O articulista que já atua na área de comunicação, contribuirá com comentários, que serão também publicados aqui no Outro Olhar (portal parceiro da Amargosa FM).

Passo promete tratar de temáticas diversas, como comportamento, política e negócios. O articulista integrará a equipe da emissora do interior da Bahia virtualmente, com participações especiais na programação da FM 105.9 em Amargosa.

Além da programação musical, a Amargosa FM tem demonstrado sua intenção de incrementar qualidade e de forma diversificada, para cumprir a missão de bem informar os seus ouvintes.


segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

É a primeira vez em 16 anos que a oposição vence as eleições legislativas na Venezuela. Com 99 cadeiras contra 46 para o chavismo, a oposição obtém maioria simples

A vitória da aliança Mesa da Unidade Democrática (MUD) para a Assembleia Nacional foi anunciada pela presidente do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Tibisay Lucena. Em pronunciamento em rede nacional, o atual presidente Nicolas Maduro reconheceu a vitória da oposição sobre a sua formação política, o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV).
“Vimos com a nossa moral, com a nossa ética, reconhecer estes resultados adversos, aceitá-los e dizer à Venezuela que a Constituição e a democracia triunfaram”, afirmou.
O boletim oficial anuncia 99 deputados para os opositores contra 46 para o 'chavismo'. Até agora, a oposição tem maioria simples. Ainda há 22 cadeiras a serem definidas.
Dependendo dos resultados, a oposição terá a maioria qualificada, exercendo grande poder sobre o país. O presidente declarou que o resultado é uma vitória da democracia e serve para "acordar" o chavismo, que perderá a hegemonia mantida por 16 anos. Também disse que foi uma vitória cirscunstacial da "guerra economica" contra o governo venezuelano.
Atraso no encerramento
O fim das eleições foi marcadas por polêmica. As autoridades prorrogaram o período de votação por uma hora para darem o direito de voto a todas as pessoas que ainda estavam na fila.
Embora o CNE tenha anunciado o fim das eleições às 18h (20h no horário de Brasília), depois disso ainda era possível encontrar sessões abertas.
Ex-presidentes acompanhavam as eleições como observadores políticos a convite da MUD e criticaram a decisão do conselho. Após as críticas, as credenciais de Jorge Quiroga (Bolívia), Andrés Pastrana (Colômbia), Mireya Moscoso (Panamá), Luis Alberto Lacalle (Uruguai), Laura Chinchilla (Costa Rica) e Miguel Ángel Rodríguez (Costa Rica) foram retiradas.
As normas eleitorais venezuelanas impedem que as urnas sejam fechadas enquanto ainda existirem eleitores para votar.
*Com informações da Agência Brasil e Globo News

sábado, 5 de dezembro de 2015

A república dos cínicos

Lembra o Conselheiro Aires, célebre personagem de Machado de Assis, que o inesperado tem sempre voto decisivo nos acontecimentos. O ano parecia caminhar para o encerramento. E em tons inglórios. O enfrentamento da crise política estava sendo empurrado para 2016. Tudo indicava que o impasse — produto em grande parte da inoperância das forças políticas de oposição ao projeto criminoso de poder — iria se prolongar, até porque o calendário político do Congresso não é o mesmo que vigora para os brasileiros comuns. Na Praça dos Três Poderes, 2015 termina por volta do dia 11 de dezembro, e o ano vindouro só começa depois do carnaval — e para alguns somente em março.
Mas os acontecimentos de 25 de novembro vieram para atrapalhar — ainda bem! No dia anterior foi preso José Carlos Bumlai, considerado um dos melhores amigos de Lula. Bumlai conseguiu empréstimos privilegiados do BNDES. Acabou falindo. Contudo, a família está em excelentes condições financeiras. Um dos seus filhos, segundo noticiou O GLOBO, é um rapaz de sorte. Tinha um patrimônio avaliado em R$ 3,8 milhões em 2004. Seis anos depois, saltou para R$ 95,3 milhões, um crescimento de 25 vezes, algo digno de um livro de como prosperar rapidamente na vida. Mas o mais fantástico é que em 2012 o filho prodígio mais que duplicou o patrimônio: R$ 273,8 milhões.
O amigão de Lula vendeu uma de suas fazendas — a Cristo Redentor — para o banqueiro André Esteves por R$ 195 milhões, valor considerado muito acima do preço de mercado. O mesmo banqueiro, também no dia 25, foi preso, envolvido em transações pouco republicanas. É um dos representantes de uma nova classe criada pelo petismo: a burguesia do capital público.
Nesta teia de relações foi incluído o senador Delcídio Amaral, líder do governo no Senado. O senador, além de vínculos com Estevão e Bumlai, nos últimos anos esteve muito próximo de Lula. E todos eles estão relacionados com o petrolão, alguns já presos; outros, ainda não. A camarilha tinha na Petrobras o instrumento principal de saque. De acordo com perícia da Polícia Federal, o desvio do petrolão foi de R$ 42 bilhões, algo desconhecido na história do mundo.
Mesmo assim, os cínicos que nos governam continuam agindo como se nada tivesse acontecido — isso para não falar das obras da Copa, da Ferrovia Norte-Sul, da Usina de Belo Monte e de Angra-3. E a conjunção da corrupção com a irresponsável gestão econômica acabou jogando o país na crise mais grave da história republicana. Teremos dois anos consecutivos de recessão — sem esquecer que em 2014 o crescimento foi zero. E caminhamos para a depressão.
O significado mais perverso do projeto criminoso de poder e da crise econômica é a destruição dos projetos de vida de milhões de brasileiros. São projetos acalentados anos e anos e que a discussão da macropolítica acaba deixando de lado: os sonhos da casa própria, de obter um diploma universitário, de se casar, entre tantos outros, que, subitamente são inviabilizados. E os maiores atingidos são os mais pobres, que não têm condições de sequer vocalizar suas queixas, seus protestos.
A velocidade da crise não pode mais ser controlada. Quando o governo aparenta viabilizar um acordão negociado com o que há de pior na política brasileira, vem a Operação Lava-Jato para atrapalhar o negócio — pois não passa de um negócio. A ação do juiz Sérgio Moro é histórica. Age dentro dos estritos termos da lei e já obteve grandes vitórias. Até o momento, foram 75 condenações, 35 acordos de delações premiadas, 116 mandados de prisão e R$ 1,8 bilhão recuperados. E a 21ª fase da Lava-Jato acabou impedindo o acordão. Não é que a Justiça age na política. Não. É a política — entenda-se, os partidos e parlamentares de oposição — que não consegue estar à altura do grave momento histórico que vivemos. A oposição não faz a sua parte. Evita o confronto como se a omissão na luta fosse uma qualidade. Se estivesse no Parlamento inglês, em maio de 1940, defenderia negociar a paz com Adolf Hitler. O governo Dilma caminha para o fim sem que a oposição seja o elemento determinante.
Há uma fratura entre o povo brasileiro e a Praça dos Três Poderes. O poder é surdo aos clamores populares. Não é hora de recesso parlamentar. Recesso para quê? Em meio a esta crise? É justamente nesta hora em que o país precisa dos seus representantes no Congresso Nacional. Também não cabe a quem é responsável no STF pela Operação Lava-Jato — ou ao conjunto da Segunda Turma — gozar as intermináveis férias forenses. Há momentos na história de um país que férias ou recesso não passam de subterfúgios para esconder o desinteresse pelos destinos nacionais.
Só sairemos da crise econômica quando resolvermos as crises ética e política. É uma tarefa de sobrevivência nacional. Não é apenas um caso de corrupção de enormes proporções. É mais, muito mais. O conjunto da estrutura de Estado está carcomido pelo projeto criminoso de poder. A punição exemplar dos envolvidos no petrolão abre caminho para enfrentar a corrupção em todos os setores do Estado — pensando Estado no sentido mais amplo, incluindo o conjunto dos Três Poderes.
É indispensável retomar a legitimidade. E só há legitimidade com o combate implacável à corrupção. A impunidade está solapando as bases do Estado Democrático de Direito. A democracia não é instrumento para roubar o Erário e os nossos sonhos. Pelo contrário, é através dela que podemos exercer o controle efetivo da coisa pública. É somente através da democracia que construiremos o Brasil que sonhamos.


                                                        Marco Antonio Villa é historiador / Fonte: O Globo
Neymar, o Robinson Crusoé do Futebol Brasileiro
    Em tempos de outrora, o Futebol Brasileiro encantava pela sua versatilidade e capacidade de improvisação, com a conquista de Copas do Mundo vencidas na base do talento. 1958, Didi, o “príncipe etíope” e pai do chute folha seca; Pelé, um garoto de 17 anos que fizera um gol antológico na final contra a Suécia, “chapelando” o zagueiro e finalizando de forma magistral. 1962, Garrincha, o “anjo das pernas tortas”, entortou com dribles desconcertantes vários “joões”. 1970, seleção brilhante, celeiro de camisas 10 – Pelé, Gerson, Rivelino e Tostão – e o camisa 7 que fez gols em todos os jogos, o eterno ídolo do Botafogo e “furacão de 70”, Jairzinho.
    Na última década, o maior orgulho do nosso futebol, a Seleção, caiu em um pragmatismo tático; não esqueçamos da entressafra de jogadores talentosos que possam sustentar a pesada amarelinha. O ápice da crise foi o impagável e tétrico 7 x 1, cifra que já virou conceito para definir um vexame. Neste ínterim, assistimos o advento de Neymar, jogador que faz jus à tradição futebolística do Brasil. Habilidoso, ambidestro, atrevido, preciso nos passes, aguçado faro de gol e principal revelação dos derradeiros anos.
    Neymar foi lapidado na iluminada divisão de base do Santos, formando com Paulo Henrique Ganso, a segunda edição dos Meninos da Vila, geração vitoriosa que ganhou campeonatos paulistas, Copa do Brasil e Libertadores da América, este último, o Alvinegro Praiano não conquistava desde 1963. Em 2013, transferiu-se para o Barcelona numa polêmica negociação, até hoje, envolta em névoas. Explicitamente, foi um desafio para Neymar jogar e conquistar espaço no Barça, maior vencedor da Champions League no Século XXI, elenco constituído por craques – Iniesta, Xavi e Busquets – cuja estrela maior, a Aldebarã da constelação de Touro, é Lionel Messi, um dos maiores atletas de todos os tempos.
    A primeira temporada no time culé foi mediana para a joia brasileira: apresentou lampejos de gênio e número parco de gols. Porém, na segunda temporada, os ventos mudaram, e Neymar foi imprescindível na conquista do Triplete pelo Gigante da Catalunha, além de ter marcado o gol do título contra La Vecchia Signora na final da Champions League, a maior competição de clubes do mundo. Certa vez, ouvi um comentário pouco robusto sobre Neymar: “ele é um jogador que some em decisão”. Os fatos apontam o contrário: gols nas finais do campeonato paulista, Copa do Brasil, Copa das Confederações, Libertadores da América e a já citada Liga dos Campeões. Não me lembro de outro jogador que tenha feito gols na final das duas principais competições continentais do mundo. Outra informação errônea propalada nos bate-papos é que o craque brasileiro não joga bem na Seleção, todavia, a estatística nos aponta outra ótica: com apenas 23 anos, 46 gols em 67 partidas, média aproximada de 0,7 gol por partida e 5º maior artilheiro.
    No Barcelona, Messi, Suarez e Neymar, o aclamado e letal Trio MSN, já formam o ataque mais avassalador em quantidade de gols por temporada na história do atual campeão espanhol. Graças a números expressivos e títulos maiúsculos, Neymar foi indicado à Bola de Ouro, concorrendo com Messi e Cristiano Ronaldo, o prêmio de melhor jogador do mundo em 2015; a última indicação para um jogador brasileiro foi para Kaká no distante ano de 2007. Mesmo agraciado pela deusa Fortuna, Neymar teve o azar (ou sorte) de fazer parte duma geração pouco talentosa do Futebol Brasileiro, o que torna a vitória na Copa do Mundo um triunfo quase hercúleo. Se Nelson Rodrigues estivesse vivo, chamaria Neymar de Robinson Crusoé do Futebol Brasileiro, obra clássica de Daniel Defoe, que narra a história de um náufrago isolado numa ilha. Até quando Neymar continuará ilhado na Seleção Brasileira?


Tosta Neto, 04/12/2015 
Sobre o Autor:
Tosta Neto Tosta Neto é Escritor, Historiador e Colunista no Outro Olhar .

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

ÁUDIO : 'Temos que distinguir o pedido de impeachment dos motivos de Eduardo Cunha para aceitá-lo', diz autor

O jurista Miguel Reale Junior, um dos autores do pedido de impeachment da presidente aceito por Eduardo Cunha, afirma que o documento traduz um sentimento da sociedade. 

OUÇA  ABAIXO

‘Cunha, por motivos que podem ser recriminados, desencadeou o pedido, mas ele tem vida própria e não tem identidade. Ele o segurou pro três meses, se entendia que era grave deveria desencadeá-lo imediatamente. É responsável por ter se omitido’, diz.
O jurista rejeita estar arquitetando um golpe contra a presidente. ‘Não há golpe nenhum. Ela tenta passar por uma vitimização idêntica à de Collor. Impeachment é um recurso absolutamente legítimo e um processo difícil, pois precisa ser aprovado por dois terços da Câmara e dois terços do Senado’, afirma.
CONTEÚDO CBN

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

O dilema do PT
Afinal, o PT quer salvar Eduardo Cunha para salvar a presidente Dilma, ou quer cassar o presidente da Câmara para tentar salvar a reputação do partido, se é que isso ainda é possível? O que importa mais para o PT, salvar Dilma ou a possibilidade de Lula chegar vivo politicamente a 2018?
O ministro da Justiça, certamente atendendo a uma orientação de Dilma, declarou que o governo não está fazendo pressão contra Eduardo Cunha, que continua certo de que todas as denúncias que surgem contra ele têm como fonte o Palácio do Planalto.
Mas o presidente do PT, Rui Falcão, fez um apelo público aos três representantes do partido no Conselho de Ética para que votem pela admissibilidade da denúncia que, se acontecer, significará que o presidente da Câmara não tem mais força para controlar o Conselho.
Ele já recebeu contra 7 dos 9 votos previstos, e não é possível hoje dizer se os três petistas farão a balança pender contra Cunha, ou se o salvarão, e nem mesmo se haverá algum voto inesperado contra ele.
Esta noite brasiliense será certamente das mais quentes, muito além do calor de verão que fez o presidente do Conselho de Ética, deputado José Carlos Araujo, reclamar do ar condicionado da sala.
As tentativas de retardar a decisão, ou mesmo de aprovar uma punição mais branda a Eduardo Cunha antes mesmo de começar o processo, aconteceram como o previsto.
O tempo que perderam discutindo quem chegou primeiro à reunião, quem furou a fila de presença, foi fundamental para que a votação não acontecesse ontem mesmo. O deputado Manoel Junior, do PMDB, suplente no Conselho, jogou como um titular do time de Cunha.
 Fez diversos questionamentos sobre o regimento, confundindo o já confuso presidente do Conselho, apenas para ganhar tempo, nenhuma questão era fundamental ou realmente necessária.
O deputado Wellington Roberto (PR-PB), que apóia o presidente da Câmara, apresentou um voto em separado em que, ao mesmo tempo considera que não há motivos para processar o presidente da Câmara, e pede uma censura pública a ele.
O que parece uma contradição em termos tem sua lógica. Se o Conselho considerar que não há motivo para processar Eduardo Cunha, pode haver um recurso ao plenário para rever a decisão. E tudo indica que hoje Cunha já não tem maioria para se livrar do processo.
Mas, se o Conselho decidir puni-lo de alguma maneira, encerra-se lá mesmo a discussão. O deputado Wellington Roberto quer uma punição por que, ao negar durante depoimento na CPI da Petrobras que possuía contas no exterior, Cunha não teria mentido, mas faltado com "a responsabilidade do cuidado nas suas declarações, exigindo o compromisso com a sua exatidão maior do que a demandada dos demais 512 deputados".
Eis, senhores, um deputado rigoroso, ético, que mesmo sendo reconhecidamente um aliado de Cunha, quer puni-lo para que pense melhor antes de falar. Enfim, a reunião do Conselho de Ética foi dominada pela pantomima costumeira na Câmara, e até mesmo o deputado Chico Alencar quase foi usado para atrasar mais ainda a decisão final sobre Cunha.
Como também o deputado do PSOL está sendo acusado de falta de decoro no Conselho de Ética pelo ético deputado Paulinho da Força, uma manobra de Cunha e aliados contra o PSOL, que liderou o processo contra o presidente da Câmara, o presidente do Conselho José Carlos Araujo chegou a colocar na pauta da reunião de hoje o caso de Alencar antes do de Cunha, alegando que o deputado do PSOL certamente gostaria que seu caso fosse logo julgado.
Mas Chico Alencar disse que considerava mais lógico continuar analisando o caso de Cunha para depois entrar o seu na pauta.
Hoje, prevêem-se mais manobras regimentais antes que a votação prossiga, mas, se nada acontecer na noite de Brasília, é provável que a questão seja resolvida hoje. Uma coisa é certa: os três petistas que compõem o Conselho de Ética não terão uma noite tranqüila.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

sábado, 28 de novembro de 2015

'Se Brasil formasse médicos como professores, pacientes morreriam', diz Mercadante

FOLHA DE SÃO PAULO
ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
EDITORA DE "MERCADO"
28/11/2015 02h00

Mais profissionalização é a resposta do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, à análise de economistas de que falta qualidade ao ensino brasileiro e, sem isso, a economia do país não crescerá de forma sustentada.

A formação dos professores tem que se voltar para a prática, diz: "Se formássemos nossos médicos como formamos nossos professores, os pacientes morreriam".

O ministro critica o desempenho das universidades que preparam os docentes —"principalmente no setor privado"— e diz que o MEC vai exigir contrapartidas para repassar as verbas dos programas federais.

Mercadante afirma que há simpatia à ideia de incluir o ensino profissionalizante no currículo do ensino médio e propõe vincular o Pronatec, de formação técnica, ao EJA, antigo supletivo.

Defende a política de dar prêmios em dinheiro a escolas e professores que atingirem metas e acha que entregar a administração escolar a Organizações Sociais (entidades privadas sem fins lucrativos) pode dar bom resultado.

Não apoia, no entanto, a política de "charter schools", em que escolas privadas recebem do Estado para prestar o serviço da educação gratuita.

Folha - Vários economistas têm dito que o Brasil não vai crescer de forma sustentada sem aumento de produtividade, e a qualidade da educação está na raiz desse aumento. Por que o ensino não melhora?

O Brasil tem que acelerar sua transição para uma economia do conhecimento. Educação, ciência e tecnologia e inovação são a base dessa estratégia.

A educação, principalmente, se estiver melhor articulada com o setor produtivo.

O empresariado brasileiro tem uma certa dificuldade em ter cultura inovadora, o que tem muito a ver com sermos um capitalismo tardio, em que o empresário acha que inovar é comprar máquina pronta e acabada e não fazer melhor, mais barato, mais eficiente que o que fazia antes. Este caminho é o que nos vai permitir avançar. Conseguimos isso na agricultura.

É uma área em que o Brasil tem vantagens competitivas.

Mas não é só porque temos terra e água. Temos a Embrapa, temos tecnologia, uma indústria de máquinas e equipamentos.

E capital também.

Mas é isso que gera o capital. Inovação, competitividade e eficiência vão atrair o capital e modernizar o setor.

O caminho tem que ser como o do brigadeiro Montenegro [Casimiro Montenegro Filho], que criou o ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica], para formar uma geração de engenheiros, para que pudéssemos ter uma indústria aeronáutica.

O foco era a indústria, mas o alicerce era educação.

Ele quis chegar, e chegou, à indústria aeronáutica e astronáutica, mas pela educação.

Esse deveria ser o caminho do Brasil. Precisamos mais dessa parceria com universidades.

Por que o Brasil não está conseguindo melhorar a qualidade do ensino?

Está avançando. Educação é muito complexa: uma rede de 50 milhões de alunos, 2 milhões de professores, com o histórico que herdamos, é um processo.

Avançamos muito no acesso às creches, na educação infantil, no ensino fundamental. A jornada escolar está aumentando. Passamos de 4,7 anos para 8 anos em menos de 15 anos. Na universidade, nem falar. Eram 2,5 milhões nos anos 2000, agora são 7,5 milhões e meio.

Mas o problema não é o acesso.
Acesso e permanência.

O sr. não citou o ensino médio, em que o acesso, a permanência e a defasagem não são boas.

Em 1991, havia 2,4 milhões de estudantes no ensino médio. Hoje são 7 milhões.

Mas só 70% estão no ensino médio, grande parte fora da idade correta.

Mas houve uma inclusão de quase 5 milhões de jovens, num período muito curto. O problema é o que herdamos.

Mais do que dobramos a rede, e foi a rede pública que suportou esse crescimento, pois a privada praticamente não se alterou.

Houve grande avanço em termos de acesso e permanência em todos os níveis, inclusive no ensino médio, que acho que merece uma reflexão maior, porque é mais complexo.

O Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, que leva em conta aprovação escolar (chamada de fluxo) e médias de desempenho nas avaliações], ao incluir o fluxo, sinaliza a importância de não deixar nenhuma criança para trás.

E houve avanço também na aprendizagem, que é a coisa mais importante, o foco da educação. A meta mais importante é a da qualidade, em todos os níveis.

No caso do Pisa [Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, que avalia estudantes na faixa dos 15 anos], a fotografia ainda é ruim, mas o filme é muito bom.

O fato de que o Brasil foi o que mais evoluiu no mundo, passou países da América Latina dos quais sempre estivemos atrás, tendo feito uma inclusão dessa magnitude, mostra que houve um avanço importante, mesmo em relação à qualidade.

Quando pegamos nossa amostra, de 950 escolas e jovens de 15 anos, a média é problemática. Onde está a dificuldade real? Não é na média. São os pobres. Onde não avança, onde o Ideb não avançou no ritmo que se esperava é no último quartil da renda, nos 25% mais pobres, que vêm de uma família não letrada, que já na infância tem um vocabulário em média de um terço do das famílias letradas.

É essa criança, a criança da periferia das grandes cidades e das pequenas cidades do interior, a criança que não está indo para a pré-escola. Elas não desenvolvem as habilidades cognitivas e não cognitivas na idade adequada.

Já identificamos a dificuldade da leitura, do aprendizado da escrita e dos elementos básicos da matemática —22% das crianças não leem na idade adequada, 34% não escrevem e metade não aprende a matemática até os oito anos.

E, se a criança não aprendeu a ler, não vai ler para aprender. Quando passa para a sexta série, se desorganiza. É o primeiro momento da evasão.

E no ensino médio, com 18, 19 disciplinas, não consegue mais acompanhar.
O foco tem que ser na leitura, na redação e na matemática.

Damos bolsa para 300 mil professores e professoras, 600 mil formadores das redes de universidades federais. Em algumas, avançou muito. Noutras não avançou nada.

Em muitos cursos de pedagogia e licenciatura estamos tendo uma formação teórica interessante, uma reflexão sobre a filosofia da educação, a teoria da educação, mas muito pouco de prática de aprendizagem na sala de aula.

O Estado de São Paulo está mudando isso agora. Existe uma disposição do governo federal para mudar também?

Estamos trabalhando fortemente para isso.

Se nós formássemos os nossos médicos como formamos nossos professores, íamos ter uma crise na saúde dramática. Porque, se um médico chegar à frente de um paciente e começar a refletir sobre a teoria da saúde, sobre ética e saúde, filosofia da saúde, o paciente morre. Ele tem que fazer o diagnóstico e dar a terapia.

Se o engenheiro não botar o prédio na planta e fizer o cálculo, se começar a refletir sobre as várias opções da teoria da construção civil, o prédio vai cair.

Não que a gente tenha que abdicar de uma reflexão teórica abrangente na educação, mas tem que ter a prática, como aprender, como transmitir conhecimento, como liderar uma sala de aula, como observar os alunos, acompanhá-los.

Qual o obstáculo para mudar o currículo?

A grande mudança de que precisamos é fazer a base nacional comum curricular. Ela vai exigir, como em outros países, uma rediscussão dos cursos de pedagogia e licenciatura. Vai definir o que é o direito de aprendizado de qualquer aluno em qualquer lugar do território nacional. Isso reorienta os cursos de pedagogia. Temos que repactuar. O grosso dessa formação está se dando na rede privada.

Temos alguns instrumentos para ajudar na construção. Um é o Pibid [Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência, que dá bolsas para estágios na formação de professores], com 90 mil bolsistas, e o Pafor [Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica], que já é para a rede.

Damos 90 mil bolsas e só 18% viram professores da rede. O projeto é da faculdade e não da rede. Temos que ter exigências da rede.

Vai direcionar para matemática e português?

E para aprendizagem. O MEC vai monitorar esses estágios e estabelecer condições. O foco é a aprendizagem do aluno. Com isso, vão ser formados dentro de uma nova concepção, em vez de só fazer um trabalho para a faculdade sem qualquer compromisso para a escola.
Hoje, quem escolhe a escola é o aluno ou a faculdade, e não o MEC nem a rede.

Como fazer na prática?

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Como fizemos com o Fies [Fundo de Financiamento Estudantil, que financia estudantes do ensino superior]. A inscrição será no portal do MEC, que vai estabelecer quais as escolas prioritárias, vai rediscutir o programa com as faculdades, focado nas prioridades educacionais.

O que o Fies está fazendo é induzir o sistema à qualidade: "Ora, melhora a qualidade e você tem mais bolsas". Evidente que tirou o sistema da zona de conforto.

Então houve falta de objetivos ao expandir tanto o sistema sem esses critérios?

Não, acho que, na política pública, você vai aprimorando e construindo em cima de uma experiência concreta. Vai identificando os problemas em cima do que vai construindo.

Por que foi preciso fazer uma revisão do seguro-desemprego, que está aí há anos? Da aposentadoria? Da pensão por morte? Porque são programas sociais que precisavam de ajustes.

Na educação é a mesma coisa. Por exemplo, no Plano Nacional para a Alfabetização na Idade Certa, percebemos que não adianta fazer uma relação direta com as universidades, em algumas funcionou muito bem, mas em outras não está havendo aumento do aprendizado na sala de aula.

Precisamos melhorar no Nordeste, e é possível. Há boas experiências, no Ceará e na Bahia, vamos fazer um programa especial para o Nordeste.

No Ceará houve um investimento muito forte na gestão, na profissionalização dos diretores, na autonomia para contratar e demitir professores. Existe alguma disposição do MEC de incentivar também esse movimento?

Concordo inteiramente. O mais importante na aprendizagem é a relação professor-aluno, e a segunda coisa é o papel do diretor.

O diretor é imprescindível, precisa ter noções de administração, orçamento, gestão, pedagogia, habilidade e formação para administrar conflitos não violentos, criar uma cultura de tolerância. É quem tem que preencher quando os professores faltam, e estão faltando demais em muitas redes.

O MEC vai ter um programa de formação e criar uma certificação de diretores. Os diretores serão escolhidos já com essa certificação: quem quiser ser diretor terá que se qualificar previamente. Para ser certificado, precisará passar por uma avaliação e elaborar um projeto pedagógico para sua escola. Isso pode dar um salto importante.

Mas voltando um pouco à questão da qualidade, não é só o quartil mais pobre que tem desempenho pior, mas em todos os quartis o aprendizado do aluno brasileiro é mais baixo que o de países semelhantes. Não é um sinal de dificuldade para melhorar a educação? Onde está travando a melhoria do ensino?

O próprio Pisa, em seu relatório, aponta o Brasil como um país que foi capaz de aumentar a inclusão de alunos e a aprendizagem. Muitos desses alunos vieram de regiões rurais, mais pobres. Nós evoluímos trazendo a pobreza para a escola, a população de famílias de pouca escolaridade. E apesar disso a nota de matemática melhorou em todos os níveis.

Não vejo problema em comparar o Brasil com países da OCDE. Mas temos uma renda per capita de US$ 15.838, dados de 2014, e a média da OCDE é US$ 38.766. Eles investem muito mais por aluno. Nosso investimento em porcentagem do PIB é maior que o deles. A ONU recomenda de 3% a 4% do PIB, estamos investindo 6%, mas nosso PIB per capita é muito menor, nosso orçamento por estudante é muito menor.

Mas países semelhantes ao Brasil, como México, Chile, têm obtido melhor resultado.

O Brasil fez uma política de inclusão fantástica, sem precedentes, e, apesar disso, está melhorando a qualidade.

Onde está melhorando menos é nessa população que entrou na escola tardiamente e traz essa herança. Esse jovem de 15 anos é dessa escola do passado.

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Precisa andar mais rápido? Precisa. Por isso estamos repensando, buscando integrar os programas com foco no aprendizado.
E mudando a política de formação e valorização dos profissionais. O Piauí, por exemplo, está dando um 14º salário se houver mais de 25 alunos por sala, o resultado do Ideb superar a meta e assiduidade dos professores ficar dentro do estabelecido.

No Ceará, o município tem aumento do ICMS se tem bom resultado. Precisamos ter mais criatividade, mais inovação, mais motivação dos profissionais na sala de aula.

A motivação passa então por um reconhecimento em dinheiro?

No caso dessas redes, o que estou vendo é que esse mecanismo de valorização, de bonificação pelos resultados, está tendo sucesso. Vamos olhar essas experiências sem preconceito.

Em São Paulo houve essa experiência e a conclusão foi de que não dava o resultado esperado.

Estou jogando luz sobre experiências que estão dando certo já há vários anos. O que me preocupa são algumas propostas como o programa do PMDB, que ainda vai ser discutido -espero que de forma aprofundada-, de retirar as vinculações de tributação.

Se retirar a obrigação do prefeito de investir em educação, do governo do Estado, da União, se retirar a obrigação de que o dinheiro do petróleo e do fundo social venham para a educação, como vamos garantir os recursos que estão faltando?

Porque, apesar da vinculação, nosso investimento per capita é baixo quando comparado com os países mais desenvolvidos. Se retirar a vinculação, vai tirar dinheiro da educação.

Se é verdade que educação não se resolve com dinheiro, não se resolve sem dinheiro nem com menos recursos.

Temos um problema de financiamento da educação, principalmente em relação às metas do PNE [Plano Nacional da Educação], que são muito ambiciosas e propõem que a gente chegue a 10% do PIB. Só não discute como. E o PNE não pode virar o tratado de Kyoto, com o que todo mundo concorda, mas depois ninguém consegue cumprir. Temos que discutir o financiamento da educação, formas de financiamento novas, que viabilizem, porque é um investimento estratégico.

Mas o investimento em educação no Brasil vem crescendo em proporção do PIB ano a ano, sem uma melhoria correspondente. O Ipea divulgou recentementeum estudo mostrando que o gasto em educação no Brasil é pouco eficiente. Por que o dinheiro não está dando o resultado esperado?

Mas pusemos 5 milhões de jovens no ensino médio, 5 milhões de estudantes universitários a mais. Estamos comparando com países cuja população total é menor do que o que colocamos a mais.

Não é um problema então de má administração dos recursos?

Não. Houve um esforço brutal de inclusão social. Resolvemos alguns problemas, como em relação ao analfabetismo. Em 2004 era 11,5% e estamos com 8,3%. Até os 20 anos, 0,9%, erradicamos o analfabetismo. Até 30 anos, são 2,1%.

*Mas o analfabetismo funcional ainda é alto

Mas tivemos que trazer milhões de jovens, 5 milhões a mais no ensino médio, 5 milhões na universidade.

NoPronatec, fizemos um programa com 9 milhões de matrículas no ensino técnico profissional. "Ah, mas e a qualidade?" Aí vocês não dão destaque, mas deveriam ter falado do World Skills, olimpíada mundial do ensino técnico, em que o Brasil foi primeiro lugar em 69 países.

Fui à assembleia da Unesco e todos os ministros da educação dos países ricos queriam discutir Pronatec. E a pergunta é a seguinte: como um emergente tirou primeiro lugar no World Skills? O que vocês fizeram?

Há um esforço forte de formação da rede Sest/Senai, não?

Mas, das 35 medalhas de ouro que tiramos, 28 tinham bolsa do Pronatec. Foi a parceria que fizemos. A rede Sest/Senai faz um trabalho excepcional, e nós trabalhamos em íntima parceria. Massificou o acesso.

Por que o Brasil é bom em futebol? Porque em cada esquina tinha um campinho de futebol. Por que nós somos bons de vôlei de praia? Porque temos muita praia, o pessoal começou a jogar vôlei. Onde o brasileiro tem chance e oportunidade, temos bons desempenhos. Na hora em que se massificou o ensino técnico profissional surgiram os talentos e nós ganhamos a olimpíada.

Mas o World Skills não reflete todo o ensino. Os participantes fazem um treinamento intensivo, de meses, para participar.

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Ah, só nós, né? A Coreia não faz? Você acha? Todos esses países fazem treinamento especial.

Nós investimos R$ 1,6 bi nos centros de formação técnica do Senai para criarmos uma cultura de inovação. Precisamos dessa parceria. Temos um sistema excelente de formação técnica, mas sem escala. Precisa ter escala. Neste ano, com restrições orçamentárias, o Sistema S vai colocar mais recursos, R$ 5 bilhões, cada um na sua área. Vão assumir com mais protagonismo o Pronatec, a Embrapii e outros programas de parceria.

Em troca de não perder uma parcela do imposto que era repassado pelas indústrias.

Exatamente. Muito melhor construir uma parceira, um acordo.

Por que o ensino profissionalizante não está incluindo na base comum curricular?

Grande questão. Sobre o ensino médio, um dos grandes problemas é que, apesar de entrarem 5 milhões de alunos, temos evasão e uma escola que tem que ser mais motivadora e agradável. 20% dos jovens de 18 a 24 anos estão na universidade. Onde estão os outros? O que oferecemos a eles? Só um ensino regular? Não é suficiente.

Na base nacional comum do ensino médico, temos que trazer uma base técnica profissional. Porque esse jovem está olhando o mercado, e muitos estão saindo para buscar uma oportunidade.

É preciso criar um diálogo com o ensino técnico profissional já no ensino médio, sem prejudicar nem desmotivá-los a ir para a universidade, se quiserem, ou para uma escola técnica de dois anos pós-médio.

Mas ter um ensino técnico concomitante com o regular.

As escolas com melhor desempenho no Enem e no Ideb são as que integram as duas coisas.

E por que o ensino técnico não foi incluído na base comum curricular?

Outro ponto é o do EJA [Educação de Jovens e Adultos, o antigo supletivo]. O Fundeb investe R% 5,7 bilhões por ano. Dos matriculados, só 9,4% concluem e são certificados. Os diretores de rede têm interesse na matrícula porque ela assegura participação no Fundeb. Mas é evidente que ele tem que ser repensado.

Vai se criar algum tipo de condição?

Só vejo um caminho: a relação com o Pronatec. Trazer o ensino técnico profissional para essa população adulta que tem uma grande defasagem idade-série.

Tenho um secretário-executivo cujo pai é pedreiro. Tem mais de 60 anos. Ele perguntou "Pai, por que o senhor não conclui o ensino médio?" O pai respondeu "Eu trabalho oito horas por dia, carrego saco de cimento, tijolo, sustentei vocês todos com meu trabalho de pedreiro. Vou estudar geografia, história, filosofia, sociologia, à noite, cansado o que isso vai mudar na minha vida a essa altura do campeonato". É uma pergunta básica. Aí meu secretário perguntou "Mas o senhor consegue ler a planta do engenheiro?" "Não, quem faz isso é o mestre de obras". "E se tivesse uma formação para ler a planta e pudesse ser mestre de obras?" "Onde é esse curso, que eu quero entrar."

É evidente que uma formação do EJA que parte da formação que o profissional já tem, se isso é reconhecido, certificado, e dou uma formação para dar um passo na profissão, esse profissional vai estudar com paixão. Foi o que o Pronatec mostrou.

Por que 9 milhões foram para o Pronatec e no EJA só 4,9% concluem? Porque querem uma formação voltada para o mercado de trabalho.

Mas a grande maioria do Pronatec, 70% desses 9 milhões, fez cursos de curta duração.

Porque são duas coisas distintas, uma parte é formação técnica e outra é tecnológica.

O ministro da Educação, Aloizio Mercadante
Para a mãe do Bolsa Família, a porta para saída do programa é o Pronatec, para tentar entrar no mercado de trabalho, montar uma microempresa.

A mesma coisa em relação ao trabalhador desempregado. Se ele faz um curso de requalificação profissional, tem mais chance de se reinserir no mercado de trabalho num melhor padrão.

Temos que aproveitar a crise, é um momento tão importante que a gente não pode desperdiçar. A crise no mercado de trabalho vai exigir mais formação. Temos que aproveitar o desemprego e oferecer: "Venha estudar, que o Brasil vai ganhar mais eficiência e mais produtividade".

Por outro lado, um estudo do Ministério da Fazenda com 160 mil desempregados, que acaba de ser publicado, concluiu que os cursos de curta duração do Pronatec não aumentam a empregabilidade nem a renda.

Não concordo com aquele estudo, que é do terceiro escalão do Ministério da Fazenda.

O MEC tem algum estudo semelhante?

Tem, o Senai tem e o Banco Mundial também teve mostrando que não é este o caminho. Em 2014, com uma taxa de desemprego de 4,7%, falar que não teve empregabilidade alta com amostra absolutamente pequena em relação ao programa Não acho um dado relevante.

Como o MEC acompanha a empregabilidade dos alunos do Pronatec.

A empregabilidade quem tem que acompanhar é o Ministério do Trabalho.

Mas o objetivo do programa é a empregabilidade, certo?

Sempre. Ou fazer com que quem está empregado cresça profissionalmente.

Mas, quando se implanta um programa, é preciso fazer ajustes. Fizemos uma pesquisa para olhar em cada microrregião qual o perfil, qual o emprego portador de futuro daquela região, para oferecer uma formação técnico-profissional ligada à perspectiva do mercado de trabalho.

É preciso uma análise da estrutura produtiva e da perspectiva futura do mercado de trabalho. Não é simples fazer isso.

O sistema S tem que lutar para que o aluno conclua o curso e não simplesmente se acomodar porque recebe um repasse de recurso.

Tudo isso tem que ser aprimorado. Agora, o resultado é fantástico. Quem não quer ver é só olhar para o World Skills.

Um dos problemas...

...Eu não gosto dessa discussão. O ajuste fiscal tem que ser feito, nós temos uma situação fiscal difícil. Mas não dá para fazer uma análise simplificatória de políticas sociais para justificar ajuste fiscal, isso não é um ajuste de boa qualidade.

O que o senhor está chamando de análise simplificatória é esse estudo da Fazenda?

Não... estou falando só preventivamente.

No caso do Fies, acha que houve também análise simplificatória?

Não, acho que houve uma mudança indispensável. Participei desse processo que te descrevi.

Uma das causas desse descasamento entre quantidade e qualidade não é a falta de parâmetros de avaliação da política pública em educação?

Mas há uma avaliação.


Não estou me referindo ao ensino básico, mas a esses programas voltados para a produtividade.

O Brasil é uma referência. Os países desenvolvidos todos estão discutindo o Pronatec e o World Skills. Os países pobres, a África portuguesa, onde ajudamos a implantar a rede de ensino, o olhar deles é para o nosso sistema de avaliação. Porque a maioria dos países não tem um sistema de avaliação da universidade privada.

Nós temos o CPC [indicador de qualidade de cursos superiores] e vamos introduzir o fluxo agora. Uma universidade que forma mais alunos em porcentagem terá um bônus. Os cursos que tiram notas ruins perdem não só o Prouni e o Fies, mas perdem o vestibular.

Há que ter rigor na avaliação. O Ideb, a ANA, são sistemas de avaliação.

Mas estou perguntando sobre os programas específicos voltados a aumento de produtividade e inovação. O quanto se acompanham as pessoas que receberam o investimento? O investimento em ensino superior, que é alto no Brasil, beneficia o aluno, individualmente. Como o MEC acompanha o retorno desse investimento em termos de desenvolvimento do país? Aumentou o número de patentes de quem ganhou o Ciência sem Fronteiras? Eles voltaram para o país? Como avaliar se esse dinheiro está sendo bem empregado?

Temos que aprimorar os programas. O Ciência sem Fronteiras não é diferente, e estamos discutindo.

Mas precisamos internacionalizar. Um estudante desses que volta motivado, aprende línguas, tem um universo aberto, isso terá um impacto nessas instituições. Nos rankings internacionais, um dos problemas da universidade brasileira é a falta de internacionalização. Em muitos países, fizemos acordo com a indústria para que eles façam estágio nas empresas. Fizemos um portal em que as empresas podem encontrar os alunos, contratar para fazer P&D (pesquisa e desenvolvimento).

E existe um acompanhamento do que aconteceu com esses alunos na volta, em comparação com os que não foram?

Existe e isso é uma parceria que estamos fazendo com todas as reitorias acadêmicas, que monitoram o programa, para avaliar.

Existe já um relatório das avaliações?

Não tenho de cabeça, mas em geral a avaliação é muito positiva.

Em termos de quê?

Da atitude dos estudantes. Eles voltam muito mais motivados, muito mais focados no trabalho, com um projeto de vida, um projeto técnico-científico, mais dedicação ao estudo. Você abre um horizonte fantástico, eles voltam com muito mais garra para o desempenho. [Após a entrevista, o ministro enviou uma pesquisa de avaliação subjetiva do programa feita pelo Senado com bolsistas e ex-bolsistas. Enviou também pesquisas quantitativas que mostram impacto positivo do Pronatec para beneficiários do Bolsa Família e o estudo "Inclusão Produtiva Urbana: O que fez o PRONATEC / Bolsa Formação entre 2011 e 2014", também do Ministério do Desenvolvimento Social, mostrando aumento da empregabilidade de egressos do Pronatec ].

Faz sentido para o Brasil gastar tanto mais por aluno do ensino superior que com os do ensino básico?

É evidente que uma universidade é mais cara. Não adianta pensar a educação se não pensar de forma integrada. Sem boas universidades para inovar, fazer patentes, formar bons professores, técnicos, profissionais, o país não tem competitividade.

E na sua avaliação as universidades estão fazendo isso hoje?

Tivemos uma expansão muito grande, estamos fazendo uma reavaliação da metodologia de avaliação dos cursos de pós-graduação. Temos mais ou menos 6.500 cursos de pós-graduação, que produzem por ano hoje 500 mil títulos, livros e publicações em revistas especializadas e indexadas. Não se pode avaliar só pela métrica do volume e pelas citações. Estamos tentando introduzir uma dimensão maior da qualidade. Até março pretendemos concluir o estudo.

Citações não são uma medida de qualidade?

São um indicador, mas não pode ser o único.

Quais os outros?

É isso que estamos analisando, as experiências internacionais, para tentar introduzir.

O ministro Aloizio Mercadante em Brasília
É a favor de trazer OSs [organizações sociais, entidades privadas sem fins lucrativos que prestam serviços públicos] para gerenciar escolas públicas?

É uma experiência que tem que ser olhada rede por rede. É uma decisão da rede, tem que avaliar e verificar o resultado.

Em tese, o senhor é a favor?

Tenho muita simpatia pelas OSs em ciência e tecnologia e inovação. O Impa [Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada] é o quinto centro em matemática no mundo e é uma OS. Ele tem uma agilidade muito importante. Não conseguiríamos fazer o Enem se não houvesse parceria com OSs, que têm muita agilidade.

Tem que ter controle, transparência, contrato de gestão, tem que estabelecer contrapartida, mecanismo eficiente de gestão. Não é uma solução para tudo. Mas é um caminho.

E as "charter schools" [sistema em que o governo contrata escolas particulares]?

Vou aguardar, temos que tomar muito cuidado, pois essas são definições das redes. É preciso acompanhar, avaliar e à medida que forem exitosas a rede vai estar aberta a discutir. Vi algumas experiências de PPP para construção de equipamentos muito interessantes. A parte pedagógica é do Estado, mas a construção e a gestão são privadas.

As "charter schools" dão um passo além: a parte pedagógica é também da empresa contratada.

Nisso acho que perdemos a visão do direito do cidadão de qualquer escola pública ser responsabilidade do Estado. Os bons sistemas de educação do mundo tem professores estáveis e da rede pública.

Então o senhor é contra?

Não vejo necessidade. Não há consenso na literatura em relação aos resultados. É uma experiência piloto, nunca foi majoritária em nenhum lugar do mundo.

O sistema privado no Brasil pode disputar os alunos. No ensino médio, eles não têm aumentado. As boas escolas da rede pública estão sendo disputadas, não vejo necessidade desse caminho no Brasil.

É responsabilidade do Estado ter uma base comum, que todo aluno tenha um aprendizado que é o mesmo no país, é um direito essencial que tem que estar assegurado.

Luciano Netto - 13.jul.2006/Folhapress

Mercadante, candidato ao governo de SP, e Lula, candidato a presidente, na campanha eleitoral de 2006
Nas universidades, investimos um pouco mais por aluno, é verdade, mas as públicas são as melhores do Brasil. Essa ideia de que o Estado não pode dar boa educação não se sustenta nem empiricamente. Com criatividade e inovação, faz-se uma boa rede pública.

Na parte administrativa, agiliza, barateia. Mas o projeto pedagógico é um projeto de país, um projeto público. E um direito básico de todo cidadão.

E o ensino profissionalizante vai entrar na base comum?

Vejo grande simpatia por parte de todo secretário. A rede de ensino médio é basicamente estadual. Houve encontro em Manaus e vejo grande simpatia por parte dos secretários estaduais que uma parte da carga horária e da estrutura curricular seja técnica profissional.

O senhor vê com preocupação o aumento da influência do ex-presidente Lula no atual governo?

[pausa] O que você ia perguntar sobre educação, mesmo?

CURTA!